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Áudio: Trabalhador conquistou 13º e FGTS na década de 1960

A entrada do Brasil no século 20 pavimentou o caminho que conduziu, mais tarde, à criação da Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT. O mundo vivia o despertar da classe operária e acontecimentos como a Revolução Russa, na qual a força popular derrubou o regime absolutista do país, evidenciavam isso.

Em 1917, uma grande greve paralisou milhares de trabalhadores em São Paulo, espalhando-se, em seguida, para outros estados. O senso de justiça do operário brasileiro estava finalmente aflorando. O governo Getúlio Vargas, a partir de 1930, começou a materializar as conquistas do trabalhador. Uma série de leis e decretos era editada à medida que se faziam necessários, juntando-se às poucas normas trabalhistas já existentes.

Entre as leis da época, é possível destacar a de concessão do direito a férias, em 1925, a que criou a Carteira de Trabalho, em 1932, a que instituiu o salário mínimo, em 1936, e a que regulou as associações profissionais ou sindicais, em 1939. A criação da Justiça do Trabalho, em 1939, já prevista na Constituição de 1934, pode ser considerada um dos pilares do processo de nascimento de uma legislação trabalhista mais abrangente.

O universo jurídico do qual surgiu a CLT era composto por um conjunto de leis pontuais, conforme explica o professor de direito do trabalho da Universidade de Brasília, Victor Russomano. “A legislação era esparsa. Para cada condição específica, uma legislação era editada. Os direitos foram surgindo no decurso do tempo”. Em 1º de maio de 1943, a CLT é aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, como resultado do esforço liderado pelo ministro do Trabalho da época, Marcondes Filho.

A CLT reuniu todas as leis vigentes à época e trouxe novas regulamentações para as relações de trabalho. Os capítulos 1 a 4 do Título 4, sobre contrato de trabalho, e o Título 1, de introdução, são exemplo. Outros dispositivos legais foram introduzidos com o passar do tempo, como a Gratificação de Natal, mais conhecida como décimo terceiro salário.

Russomano considera que uma das principais características da CLT foi garantir uma condição mínima para o trabalhador, sem engessar possíveis acordos que o beneficiem. “A legislação trabalhista estabelece apenas o mínimo de proteção ao empregado. Acima desse mínimo, quaisquer outras parcelas podem ser acrescentadas, concedidas pelo empregador. O empregado e o empregador podem estabelecer um salário muito superior ao mínimo, uma jornada inferior à máxima, elevar o valor do décimo terceiro salário, ou até introduzir um décimo quarto ou décimo quinto salário”.

Ao longo de 70 anos, a sociedade brasileira viu suas relações de trabalho saírem de um processo de desigualdade para um leque de garantias que procuram corrigir a disparidade de poderes entre patrões e empregados. Para Russomano, a CLT vai além e beneficia ambos. “O elemento principal é que, no âmbito dessa industrialização de consumo, a disciplina das condições de trabalho, na qual se estabelece o mínimo, atende igualmente aos interesses de empregados e empregadores”.

Trabalhador conquistou décimo terceiro e FGTS na década de 1960

Na década de 1960, os trabalhadores brasileiros conquistaram dois importantes direitos. O primeiro foi a Gratificação de Natal, mais conhecida como décimo terceiro salário, criada em 1962 por meio da Lei nº 4.090. Cinco anos depois, foi a vez do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

O salário extra foi garantido pela Constituição Federal de 1988 como um direito do trabalhador urbano e rural, inclusive o empregado doméstico. Segundo o especialista em direito do trabalho Ricardo Pereira, o décimo terceiro surgiu depois que alguns empregadores começaram a pagar uma gratificação de Natal aos funcionários que tivessem bom desempenho.

“As empresas concediam um salário a mais no final do ano para recompensar as pessoas que prestaram um bom trabalho. Isso acabou se tornando o décimo terceiro salário de caráter obrigatório a partir da Lei nº 4.090”, explicou.

Além de dar uma ajuda a mais no orçamento das famílias, o décimo terceiro tem um papel importante na economia brasileira. De acordo com o professor de administração pública da Universidade de Brasília José Matias Pereira, o pagamento do benefício movimenta a cada ano grande quantidade de recursos no país.

O dinheiro extra ajuda a aumentar as vendas no comércio, a demanda das indústrias e até a geração de empregos. “O décimo terceiro, efetivamente, é responsável por aumentar o nível de demanda e fazer com que a economia ganhe mais dinamismo no mês de dezembro”, disse o professor. Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostram que os gastos com a gratificação de Natal injetaram na economia cerca de R$ 130 bilhões apenas em 2012.

O FGTS foi instituído em 1967 para proteger os empregados demitidos sem justa causa. De acordo com o especialista Ricardo Pereira, o fundo também foi um dos primeiros mecanismos de flexibilização das leis trabalhistas para acabar com a estabilidade do trabalhador, que existia na época.

Antes da criação do FGTS, quem completasse dez anos de trabalho em uma empresa tornava-se estável e só poderia ser demitido se cometesse uma falta grave. “Depois que o empregado adquiria dez anos, ele só poderia ser mandado embora por meio de um inquérito judicial trabalhista e desde que o empregador comprovasse a falta grave. O FGTS veio como uma flexibilização da então chamada rigidez do regime da estabilidade,” explicou Pereira.

Para formar o saldo do FGTS, os empregadores fazem depósitos mensais em contas vinculadas, abertas em nome de cada trabalhador. O valor do depósito equivale a 8% do salário pago ao empregado, com juros e correção monetária. O cidadão recebe esse dinheiro quando é demitido sem justa causa, mas também pode sacar o FGTS para a aposentadoria, em caso de alguma doença grave ou para a compra da casa própria.

Hoje, o FGTS é uma das principais fontes de financiamento habitacional, principalmente para a população de menor renda. Um balanço da Caixa Econômica Federal mostra que 797.298 pessoas sacaram o benefício no ano passado para aquisição de um imóvel, o que resultou em um montante de R$ 5,5 bilhões. Além de ser fonte de recursos para a habitação, o FGTS também é usado pelo governo para financiar obras de saneamento básico e infraestrutura.

Tem direito ao FGTS todo brasileiro com contrato de trabalho formal, regido pela CLT, além dos trabalhadores rurais e temporários. Com a aprovação no fim de março da Proposta de Emenda à Constituição 066/2012, os empregados domésticos também foram incluídos no sistema FGTS. No entanto, esse direito ainda precisa ser regulamentado e, por isso, os empregadores ainda podem decidir se recolhem ou não o benefício para essa categoria de trabalhadores.