Ronaldo Carlos é um escritor por natureza
De feição séria, falas pausadas e pensadas, Ronaldo Carlos é um escritor por natureza. Disciplinado, tem se dedicado ultimamente ao conto e ao romance, devido à dificuldade que constatou em publicar e vender poesia no Brasil. Porém, o servidor Ronaldo Carlos Mendonça, da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz-AL), foi premiado no Festival da Palavra deste ano com o 1º lugar na categoria Poesias. A premiação foi a segunda de Ronaldo, que participou das três edições do festival e ficou em 3º lugar da categoria Contos, da edição passada do evento.
Ronaldo publicou em 1989, pela imprensa oficial de Alagoas, um livro de poemas chamado Domínio da palavra; depois, em 1999, o livro de contos A história como ficção, pela HD, editora com sede em Curitiba. Em 2013, foi um dos 30 bolsistas em todo o país, escolhido pela Biblioteca Nacional para se dedicar a escrever um romance. O novo projeto já tem título inclusive: A dificuldade de ser um escritor, e é forte concorrente para uma publicação nacional.
Influenciado pela poesia moderna de Manuel Bandeira e Drummond de Andrade, Ronaldo conta que se sentiu motivado, diante da terceira edição do Festival da Palavra, a escrever um poema sobre as recentes manifestações populares que tomaram as ruas do país. O poema Manifestante virtual foi nascendo e sendo trabalhado, segundo conta o autor, inicialmente apenas em sua mente. Ronaldo meditou sobre o assunto e foi construindo os versos enquanto caminhava pelas ruas, descansava em casa ou fazia as tarefas de seu dia a dia. “Quando sentei para escrever, já tinha em mente quatro estrofes do poema”.
Manifestante Virtual começa em seus primeiros versos abordando as “dificuldades da história do Brasil”, nas palavras de Ronaldo. “Eu não queria ter nascido no passado / Viver em um Brasil repleto de perigos: / Ser um índio, por outro devorado / um português, refeição de inimigos. // Tampouco ser um negro escravizado / eu quis; nem jamais ter pretendido / Sob um senhor de engenho brutalizado, / Viver um tempo em tudo embrutecido”.
Desmistificando o passado do país, Ronaldo recorre à ironia para afirmar que não é, no entanto, devido às conquistas dos direitos humanos que devemos nos acomodar e parar de lutar por melhorias. Após apontar a importância da Constituição e da democracia, ele versa ironicamente: “Melhor então ficar em casa i’mobilizado. / Assistir à televisão, acreditar nos benefícios. / Na internet, comentar o Brasil maravilhado: / Seguro, sem corrupção, nem outros malefícios”. O poema, em seus versos finais, termina como se o poeta olhasse o leitor no olho, e apontasse para o presente e o futuro: “Agora, há países que são imaginados; / Outros, realisticamente construídos”.
“O Festival da Palavra é um estímulo muito grande para o servidor estadual que gosta de escrever. Espero que ele permaneça sempre, para estimular outros servidores a participar deste momento muito interessante, seja para escritores de contos, poetas ou compositores”, afirmou Ronaldo, demonstrando suas congratulações à iniciativa da Secretaria de Estado da Gestão Pública (Segesp).
Quem quiser comprar os livros de Ronaldo Carlos, pode entrar em contato com o autor na Diretoria de Tributação, no prédio-sede da Sefaz, para encomendá-los.
Abaixo segue o poema vencedor do III Festival da Palavra para leitura e reflexão:
MANIFESTANTE VIRTUAL
Eu não queria ter nascido no passado.
Viver em um Brasil repleto de perigos:
Ser um índio, por outro devorado,
Um português, refeição de inimigos.
Tampouco ser um negro escravizado,
Eu quis; nem jamais ter pretendido,
Sob um senhor de engenho brutalizado,
Viver em um tempo em tudo embrutecido.
Ansiei vivenciar um mundo idealizado,
Amplamente por sábios difundidos;
Usufruir seus bens concretizados
Em conceitos sabiamente concebidos.
Enfim, nasci num tempo privilegiado:
Na Constituição, tenho direitos garantidos.
E os males, hoje, já se encontram controlados
Pelo poder, democraticamente constituído.
Assim, não há porque viver indignado.
Sair às ruas, exigir coisas sem sentido:
Educação, saúde, transporte melhorados;
Para os políticos, já está tudo resolvido.
Melhor então ficar em casa i’mobilizado.
Assistir à televisão, acreditar nos benefícios.
Na internet, comentar o Brasil maravilhado:
Seguro, sem corrupção, nem outros malefícios.
Agora, há países que são imaginados;
Outros, realisticamente construídos.
Uns parecerão eternamente simulados;
Alguns, costumeiramente adormecidos.
__ E nesse secreto mundo de desperdícios,
A realidade constrói seus artifícios!
