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O Rato e a Bailarina

Há algum tempo recebi de presente de um colega de teatro, interessante poema dramático cujo título ‘o boêmio e a bailarina’ incitava uma feliz resposta a outro poema ‘a bailarina e o boêmio’. Numa agradável leitura, esse texto de caracteres teatrais nunca foi montado, o que se configura numa lástima, tal a beleza desse escrito. Já no Penedo, de forma avessa á poesia, testemunhei o espanto irracional da cena performática de “o rato e a bailarina’.

Foi na noite de sábado, 03 de junho e tudo seguia da mais perfeita ordem na representação do espetáculo performático ‘desnudas’ dos competentes ‘Saudáveis Subversivos’. Na platéia, as “excelências” do teatro penedense e uns tantos outros cidadãos comuns. No palco, a bailarina-atriz Mary Vaz cujo solo a fazia flutuar pelo tablado do Sete de Setembro numa preciosa demonstração de talento e ousadia; já o rato era um gabiru gigante nascido e crescido no Penedo, e alimentado graças aos farelos deixados por uma gente que consome o teatro local em suas várias possibilidades.

O pequeno-grande-ator aguardava então seu momento de entrada triunfal que tardava a chegar, e foi num ápice de desespero e agonia por ver sua cena sendo roubada pela bailarina-egoísta, e também por ter seu habitat invadido por estranhos humanos que ele, enfurecido, entrou em cena rodopiando em mil e uma cambalhotas de um canto a outro do palco como se fizesse mesmo parte da performance, a fazer inveja a qualquer “Cirque Du Soleil” e de forma a demonstrar seu grandioso empenho profissional de rato-ator. A bailarina-egoísta, centrada em sua dança, sequer percebeu a ameaça que seu parceiro de palco representava.

Triste e desapontado pela colega, o rato-ator cujo nome artístico “RATTUS RATTUS ALEXANDRINUS” não constava no programa da peça, recolheu-se em seu camarim no porão do theatro. Quase como uma fábula, podemos refletir na lição do rato-ator como sendo um legítimo agente da ação dramática tanto quanto a bailarina-egoísta ou até mesmos os atores da distinta platéia.

Interessante ainda reavivar a lenda do “fantasma das correntes” que supostamente habita o Theatro Sete de Setembro. Como se não fosse o bastante termos de conviver com os fantasmas vivos. É de uma boca à outra que das coxias se ouve: “existe fantasma lá!!!”. O fato é que essa afirmação vem de quem já teve a satisfação de pernoitar no Theatro (os arteiros maceioenses em sua maioria). Os ecos livres indicam talvez correntes sendo arrastadas pelas escadarias, e numa contada ou outra se aumenta pontos palpitantes, afirmando se tratar também de um fantasminha talentoso e fervoroso torcedor do flamengo numa feliz alusão ao guru de todos os arteiros pendenses, Luiz Egno e seu fair play, por sinal vivíssimo.

Mas, se há fantasma com ou sem correntes, flamenguista ou não, só mesmo sendo convidado para vê-lo ou ouví-lo, isso após ter agendado previamente na diretoria do Theatro. Mas se acaso existir, não deve ser temeroso, afinal, pode se tratar de um fantasma brasileiro, cabra da peste, bastante malandra que foi se esconder justamente na casa das belas musas Terpsícore, Tália, Euterpe, Melpomene, ambas solteiras e descompromissadas há séculos. Isso é claro, se não quisermos acreditar que mais assustador é saber da existência dos fantasmas vivos que circulam pelo theatro, a esses sim, podemos pensar em creditar um pouco de temor. Quanto ao gabiru, a bailarina-egoísta foi embora e ele enfim voltou a ensaiar seus novos números.