Felizmente, foi enjeitada pela sensata avaliação do eleitor. Mas era preciso pagar para ver. Depois de vencida a inquietação da dúvida que a acompanhava por certo tempo, decidiu disputar o comando do município de Caiçara. Contava com um pouco mais de cinquenta anos. Era em toda sua constituição física e psicológica uma cinquentinha de metro e meio de vaidade, arrogância e intolerância. A ambição era um traço marcante de sua personalidade. Que os bons ou maus anjos a tenham no seu merecido lugar. Interiormente vazia, valorizava acima de tudo a aparência exterior. Sua máxima preocupação era manter posição de destaque e fazia-se exibir de empresária, mesmo que seu patrimônio na época, estivesse à beira da falência. Não havia sequer a possibilidade de uma recuperação judicial. Foi exatamente esse caos financeiro que no julgamento de muitos eleitores a levou para a disputa. Acreditavam que uma possível vitória seria a única tábua de salvação de sua iminente bancarrota patrimonial. O pobre município de Caiçara, sob sua batuta, seria obrigado a operar o milagre para dar-lhe um novo sopro de vida por meio dos artifícios da sagrada improbidade.
Temos que observar que seu marido Pedrito Cunha, ex-prefeito de triste memória decorrente de uma desastrada administração, sem condições de pleitear um novo mandato, atuava nos bastidores, ansioso de que a vitória de Niquinha iria transforma-lo, indiretamente, no novo prefeito. Foi dada a largada para a conquista do voto. No seu curso, logo ficou constatado o desastre dos seus métodos de abordagem junto ao eleitor. A coitada, dominada pelo insuportável autoritarismo, desconhecia as regras básicas para um bom relacionamento. Era uma troglodita na festa errada e, pretenciosa, achando que arrasaria, que iria assombrar na arte de fazer política, tornou-se, na verdade, uma terrível assombração. A espontaneidade do sentimento amistoso nunca conseguiu germinar a contento, reprimido pela adversidade de um temperamento adusto. Seguia à risca o ditado popular segundo o qual o costume de casa vai à praça. Dominante no âmbito doméstico, era reconhecida por cantar de galo e seu marido, manobrado, contentava-se em cacarejar.
Naturalmente que a junção desses fatores tão adversos iriam impedir um desfecho favorável às obscuras pretensões de Niquinha. Para enganar, confessando-se publicamente vencedora por antecipação, procurou mascarar seu medo da certeza da derrota e partiu para o tudo ou nada, apelando para a mentira por meio de fantasiosas promessas. Só não chegou a prometer o céu porque não dispunha da chave para dar ao eleitor o acesso às delicias do paraíso. Sentindo-se segura da sua esperteza, achou que o eleitor era um idiota. Esqueceu-se que não basta prometer o impossível e colher seus frutos se não dispõe do poder para retoca-lo e dar-lhe aparência de verdade para convencer. Essa proeza estava muito além de suas possibilidades.
Assim, como a presunção do falso sabido, sem o mérito da persuasão, inexoravelmente há de voltar-se contra ele próprio, foi exatamente o que aconteceu com Niquinha que, aniquilada, desacreditada e derrotada, ficou reduzida á uma orgulhosa Niquinha patrimonialmente falida.
