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Policial

Mutirão de execuções penais garante direitos dos detentos de Sergipe

Desde que foi condenado a cumprir nove anos de prisão em meados de 2007, L.N., de 23 anos, decidiu que tinha de sair do cárcere pela porta da frente. Para conseguir isso, o jovem tratou de assumir um comportamento irrepreensível. Participou de programas de inclusão social, manteve-se afastado de focos rebeldes e aliou o arrependimento pelo crime cometido à sua vontade de recomeçar. A iniciativa deu certo: em pouco tempo, L.N. acabou situado entre os presos com bom comportamento. Mas o maior dos benefícios viria quando, no início de fevereiro de 2009, a mãe do detento decidiu buscar informações acerca de seus direitos no Núcleo de Execuções Penais mantido pela Defensoria Pública do Estado de Sergipe.

“Dez dias depois que fui atendida, ele foi chamado para uma audiência. Por ser bem comportado, ele teve a pena reduzida para um sexto e foi liberado. Para mim foi uma glória, pois eu já não tinha mais esperanças de que ele saísse tão cedo. Nem eu nem ele acreditávamos. E esses dois anos que ele permaneceu lá, para mim, foram como um século. Se eu não tivesse procurado ajuda da Defensoria, talvez meu filho ainda estivesse preso”, declarou a mãe. Aliviado, L.N. se entusiasma ao pensar que é, novamente, um cidadão livre. “Pretendo fazer um supletivo, um curso profissionalizante, renovar minha carteira de habilitação para poder dirigir caminhão e ônibus e aumentar minhas chances de emprego”, disse.

A agilidade do processo de L.N. e a garantia de seus direitos foram possíveis graças ao trabalho de mutirão idealizado e executado pela Defensoria Pública. A medida começou a ser materializada depois que a instituição celebrou junto ao Ministério da Justiça, por meio do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), três convênios, um dos quais voltado para execuções penais. Enquanto os trâmites para implementação efetiva do núcleo estão em fase de conclusão, a Defensoria decidiu atender imediatamente às demandas e antecipar os atendimentos.

Iniciado no início de fevereiro desse ano, o trabalho consiste na análise da situação processual de todos os presos do estado e no atendimento às famílias dos detentos que procuram por informações ou necessitam de outras medidas. Na análise, os defensores verificam quais os presos que têm direito a benefícios, que benefícios são esses e quando eles poderão ser usufruídos. Já o atendimento aos familiares está sendo realizado às segundas-feiras, a partir das 8 horas, na própria vara de execuções penais, localizada no fórum Olimpio Mendonça, conjunto Orlando Dantas.

Vantagens

As atividades são realizadas por uma equipe de oito pessoas, entre defensores titulares, defensores voluntários e estagiários. Assim que o núcleo for instituído de forma efetiva, com toda a infra-estrutura prevista no convênio, as atividades que já são realizadas serão acrescidas de mais duas ações: visitas semanais aos detentos nas próprias unidades prisionais e atendimento ampliado aos presos temporários.

Para Elber Batalha, Defensor Geral do Estado, as atividades antecipadas intensificam de forma significativa uma ação que já era referência nacional. “Esse trabalho, que já era realizado pela Defensoria e já despontava como um dos mais eficazes do Brasil, ganhou ainda mais amplitude, o que causa mais celeridade na análise dos processos”, ressaltou.

Segundo o secretário-geral da Defensoria, Edgar Patrocínio, a iniciativa antecipa as melhorias no sistema prisional previstas no projeto financiado pelo Ministério da Justiça. “Além de ajudar a desafogar o sistema penitenciário e, conseqüentemente, também as delegacias, essas ações também auxiliam a reduzir a tensão dentro das unidades prisionais. Quando os detentos percebem que há pessoas olhando pelos direitos deles, eles se tranqüilizam mais e evitam brigas e rebeliões. Um exemplo disso é o Rio de Janeiro, estado onde a Defensoria é muito atuante. Lá, o número de revoltas em unidades prisionais é quase zero”, explicou.

Ainda para Edgar Patrocínio, a iniciativa também ameniza despesas públicas. “Se um apenado conquista benefícios e é posto em liberdade na data prevista, ele não traz mais custos para o Estado. As ações do núcleo de execução penal, dessa forma, também geram economia para a sociedade”.

Estado pioneiro

Os trabalhos do Núcleo de Execuções Penais já resultaram no estudo das situações de 380 presos, entre análises processuais e atendimentos. Dentro dessa quantia, as ações concederam progressão de regime a 53 detentos. Entre os benefícios gerados, constam livramento condicional, remissão – redução da pena de acordo com os dias de trabalho de cada detento -, transferência de unidade prisional e mudança de regime fechado para o semi-aberto.

De acordo com a defensora e coordenadora do projeto, Ana Cristina Fernandes, as famílias precisam se conscientizar da importância de recorrer à Defensoria. “Não estamos concedendo ‘privilégios’. Estamos fazendo o que deve ser feito e está previsto em lei. A obrigação de realizar requerimentos jurídicos é da Defensoria. Basta que o familiar dê o nome do detento, o nome dos pais e explique a situação. Nós a analisamos e, de acordo com a análise, formulamos uma pretensão. É a partir disso que o requerimento chega ao juiz.”, explicou.

Ainda para a coordenadora, a antecipação das ações se constitui em um trabalho preparatório para o início efetivo do projeto. “Com essas atividades antecipadas, pretendemos ter o conhecimento da situação de, no mínimo, 70% dos presos de Sergipe. E apesar do número da população penitenciária ser muito alto, estamos otimistas. Com a continuidade dos trabalhos, conseguiremos deixar zerado o número de detentos com benefícios pendentes. Se alcançarmos isso, Sergipe será um estado pioneiro no país”, destacou.

O defensor titular da vara de execuções penais, Jorge Rabelo Barreto, salientou que uma das maiores conquistas desde o início dos trabalhos antecipados foi a redução das filas e do desconforto. “Antes, o atendimento não era a contento. Era um defensor para atender cem pessoas em um dia. Hoje são oito pessoas atendendo, o que faz o tempo de espera diminuir muito e a atenção a cada caso aumentar”.

A agilidade dos trabalhos também é garantida pela presença de defensores voluntários. Carolina D’ávila é um deles. Originalmente lotada no município de Riachuelo, ela comparece todas as segundas-feiras ao Fórum para reforçar a equipe e agilizar as ações. “Estamos lidando aqui com o direito constitucional à liberdade. E isso por si só já requer urgência. Por isso me habilitei a ajudar. Quanto mais auxílio, mais rápido esse trabalho anda”.

Viagem garantida

Quando entrou na sala do Núcleo de Execuções Penais para ser atendida, a prestadora de serviços gerais Marlene Silva Santos, 50, estava visivelmente nervosa. Até aquele momento, ela não havia conseguido nenhuma audiência com a juíza para solicitar que seu filho, presidiário de São Cristóvão, obtivesse autorização para fazer uma cirurgia. Em poucos minutos, porém, o semblante de dona Marlene mudou. “Gostei muito do atendimento. Entrei cheia de nervosismo e acabei saindo com esperança. Acho que até mesmo com alegria, coisa que eu não conseguia ter em lugar nenhum. Estou certa de que meu filho terá o benefício que merece”.

A artesã Maria de Lourdes Santos, 64, também compareceu ao fórum Olimpio Mendonça atrás de informações sobre os direitos de seu filho. Condenado a 17 anos de prisão, o rapaz já cumpriu dois e paga o resto de sua pena com trabalhos. Junto aos atendentes, dona Maria soube que, caso ele mantenha sua boa conduta, poderá ser contemplado com uma progressão para o regime semi-aberto. “Já fiquei muito nervosa procurando informações sobre a situação do meu filho. Mas agora foi tudo bem, pois recebi um pouco de conforto. Me sinto bem como mãe em saber que ele tem algum benefício, alguma esperança de sair. Confio que tudo dará certo”, disse.

Já a dona de casa Edvânia Santos da Silva, 34, precisava de informações sobre seu marido, condenado a 24 anos de prisão. Ao sair da sala onde expôs a situação de seu cônjuge, Edvânia ficou impressionada com a atenção e agilidade do atendimento. “Às vezes a gente chegava a vir de madrugada e dormir no lugar para pegar uma senha e ser atendida. E havia muita burocracia. Agora, em coisa de uma hora já temos o que precisamos. Sem falar que o atendimento é ótimo”, frisou.

A diarista Milene Santos Pereira, 23, também foi ao Núcleo para entender a situação de seu marido. E, ao contrário de suas experiências anteriores, conseguiu saber o que queria. “Muitas vezes saíamos daqui sem resposta nenhuma. Mas agora não tem mais isso. Agora, sempre ganhamos a viagem”. O Núcleo de Execuções Penais se situa no Fórum Olimpio Mendonça, localizado na Avenida Central 3, sem número, conjunto Orlando Dantas. Mais informações podem ser obtidas através do telefone (79) 3251- 4141.