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Alagoas

Entidades admitem que pode haver grupo de extermínio em Maceió

Monique Camila era dependente de crack e foi a 32º moradora de rua assassinada em 2010

Autoridades que acompanham o caso das mortes dos moradores de rua em Maceió não descartam a possibilidade de que os violentos assassinatos estejam sendo praticados por um grupo de extermínio. Desde o início do ano, já foram mortos 32 moradores de rua na capital alagoana. O último episódio ocorreu na madrugada de domingo para a segunda-feira (15) quando Munique Camila dos Santos, de 21 anos, foi assassinada a tiros e arrastada até um bueiro.

Desde quando começou a acompanhar o caso, a crueldade dos crimes chama a atenção de Ivair Augusto Alves dos Santos, coordenador do comitê que monitora as políticas nacionais para pessoas em situação de rua, ligado à Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República. De acordo com ele, as investigações consideram a possibilidade de que muitas mortes sejam causadas por grupos de extermínio. “Quando eu estive lá [em outubro], tanto o Ministério Público quanto a polícia diziam que não havia atuação de grupo de extermínio, mas esse quadro mudou. Ninguém ignora essa possibilidade.”

“As 32 mortes não foram esclarecidas. A Polícia Judiciária [responsável pela investigação] não se posicionou. Todas as hipóteses devem ser consideradas”, acrescentou o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Alagoas (OAB-AL), Gilberto Irineu de Medeiros, que também preside o Comitê Municipal de Apoio aos Moradores de Rua. Por sugestão da SDH, o comitê foi criado pela prefeitura de Maceió para articular políticas públicas e o apoio da sociedade civil.

“Acreditamos que seja grupo de extermínio”, disse o padre Manoel Henrique Santana, da Pastoral da Rua e pároco no bairro litorâneo Ponta Verde. Segundo ele, moradores de rua contam que viram um carro preto e uma moto preta circulando mais de uma vez nas proximidades de onde ficam.

O coordenador das pastorais sociais da Arquidiocese de Maceió, padre Rogério Madeiro, também não descarta a hipótese de atuação de grupos de extermínio na cidade, mas acrescenta outras possibilidades. “Pode ser gente contratada para matar, pode ser briga entre os próprios moradores ou pode ser acerto de contas com o chefe do tráfico.”

Segundo o padre Rogério, os moradores de rua estão com medo de ser assassinados e, por isso, recorrem aos grupos da pastoral para serem acolhidos. “A Igreja está ajudando. Há as irmãs franciscanas e o grupo Servo Sofredor, que acolhem essas pessoas.”

De acordo com o padre Manoel Henrique, o “clima de medo” é grande, e há moradores dormindo debaixo de jangadas na areia da praia.

Nos albergues de moradores de rua em Maceió, há vaga para 80 pessoas, mas, de acordo com o representante da OAB, há 312 moradores de rua na cidade. Para ele, a situação atual é a “explosão” de um quadro que vem se desenhando há muito tempo. “Isso é resultado de três décadas de ausência do Poder Público e de inexistência de políticas públicas para inserção dessa população. Os últimos governos não deram prioridade ao atendimento aos moradores de rua”, reclamou.

Além da suposta omissão do Estado, quem defende os moradores de rua ainda aponta a indiferença da sociedade. “Há uma apatia da sociedade em relação aos moradores de rua, pois eles são um incômodo para muitas pessoas. Ações mesmo, só da sociedade civil organizada, que está se manifestando mesmo”, assinalou o padre Rogério.

Segundo o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-AL, a entidade já solicitou o aumento de rondas ostensivas e a presença de policiais à paisana para segurança dos moradores. O Ministério da Justiça deslocou dez delegados (de polícias civis estaduais) para ajudar nas investigações dos crimes. Segundo o padre Rogério, também foi solicitado o envolvimento da Polícia Federal que ainda não entrou no caso.

A Polícia Civil acredita que poderá esclarecer o caso nos próximos dias e marcou para o dia 22 (segunda-feira) uma coletiva para dar informações e um balanço sobre as investigações.

Ainda não há um perfil das vítimas, mas a maioria é de homens pardos, de 20 a 40 anos. A SDH está enviando três técnicos para dar apoio à Secretaria de Assistência Social de Maceió e financiando o deslocamento de representantes da coordenação do Movimento Nacional de Moradores de Rua para a capital alagoana.