A sessão especial “A Falta de Água e o Valor das Tarifas Implementadas na Região Metropolitana de Alagoas”, realizada na tarde desta segunda-feira, 15, lotou não só o plenário da Assembleia Legislativa, como também parte do estacionamento da Casa de Tavares Bastos. A deputada Gabi Gonçalves (PP), propositora da sessão, disponibilizou um telão, tendas e cadeiras para que o maior número possível de pessoas tivesse acesso ao evento.
A BRK Ambiental venceu o leilão da Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) realizado em setembro de 2020. Com um lance de pouco mais de R$ 2 bilhões, a empresa privada será responsável pelo fornecimento de água e coleta de esgoto na região metropolitana de Maceió pelos próximos 35 anos. Em abril deste ano, pouco mais de três anos depois de ganhar o leilão da Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) para assumir os serviços de água e esgotamento sanitário em 13 cidades da Região Metropolitana de Maceió, a concessionária acumula mais de 12 mil reclamações provenientes de consumidores insatisfeitos com os serviços prestados.
“Não há nada mais simbólico hoje do que essa garrafa d’água”, disse Gonçalves, segurando uma garrafa plástica com água turva e de aparente péssima qualidade, retirada da torneira de uma casa no bairro do Trapiche, em Maceió. “Isso quando a água chega, pois pode faltar por mais de um mês, porque existe um racionamento inexplicável por parte da concessionária”, critica a deputada, que presidiu a mesa de honra.
Falando em empatia, Gabi Gonçalves pede que todos pensem no cidadão que está sem esse bem essencial. “Geralmente é uma pessoa de baixa renda, que convive com o drama de sair de casa, deixar sua família totalmente desorganizada para encontrar água em outro lugar, além de ter crianças com as mãos calejadas, com problemas de coluna, porque precisam ajudar seu pai e sua mãe em busca de água potável”, lamentou.
“A sessão de hoje foi proposta não só por mim, mas por toda esta Casa, que está sensível a essa demanda e sabe da importância de ter água na torneira. Sem água, retiramos a vida, a esperança e a dignidade. Estamos aqui para cobrar explicações e soluções, acima de buscar culpados ou apontar dedos”, ressaltou Gabi Gonçalves, dizendo que o povo clama por água de boa qualidade nas torneiras de suas casas.
Parlamentares
Presentes na sessão, ao lado de Gonçalves, estiveram os deputados Cabo Bebeto (PL), Delegado Leonam (UB), Fernando Pereira (PP) e Alexandre Ayres (MDB). O parlamentar do PL lembra que, além da falta de água e das tarifas altas, a BRK também atrapalha o trânsito da região com obras. “É o momento para ouvirmos a empresa e a população, que certamente tem reclamações. Por isso vamos promover esse debate e buscar soluções”, disse o Cabo Bebeto, que levantou uma série de questões sobre o investimento da BRK, a troca de medidores e a realização de mutirões pela empresa para equacionar problemas.
Leonam reforçou, dizendo que a Região Metropolitana de Maceió sofre com uma das tarifas mais altas do País. “As pessoas têm dificuldades para pagar e há até quem receba água barrenta”, disse o delegado, pedindo que a população presente confie no trabalho dos parlamentares em buscar a melhor solução. Ayres, ex-secretário de Saúde e também de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, disse que conhece de perto a realidade da falta d’água. “No Sertão, no Agreste e agora também na Região Metropolitana. Durante muitos anos, a população ‘se acostumou’ com a deficiência da prestação de serviços da Casal. Mas a BRK conseguiu piorar. O que era ruim, ficou pior”, afirmou Alexandre Ayres, que busca cobrar responsabilidade dos envolvidos. Uma tarefa que, segundo ele, é a vontade de todos os parlamentares da Casa.
O outro parlamentar presente, Fernando Pereira, mostrou que pretende trabalhar junto com a população, ouvindo as demandas e colaborando com o governo do Estado e com a Arsal para solucionar o serviço, tanto em relação à qualidade da água quanto ao preço da tarifa. “Logo após esta sessão, vamos solicitar sessões para outras regiões. Hoje é com a BRK Ambiental, e em breve será com a Águas do Sertão, que atua na região Sul do Estado de Alagoas, onde as cidades de Junqueiro e São Miguel também enfrentam problemas”, disse Pereira. Ele encerrou afirmando que a população está até mesmo pedindo a retomada da Casal. “Diante do que é entregue pela BRK, a Casal está fazendo falta devido ao serviço precário oferecido por essas empresas, além da alta taxa cobrada por elas.”
BRK Ambiental
O diretor-presidente da BRK Ambiental, Herbet Dantas, apresentou números e dados da atuação da empresa na Região Metropolitana de Maceió e avaliou como uma “questão cultural” a mudança de saneamento em todo o Brasil. “Precisamos passar por essa transformação. Como toda transformação gera dúvidas, nada mais justo do que termos um ambiente onde a população possa colocar seus questionamentos, tirar suas dúvidas, e a empresa está à disposição para prestar esclarecimentos, para justamente mitigar e dar respostas a cada uma dessas questões”, disse.
Herbet lembrou que a Casal não foi privatizada, mas houve uma outorga da concessão do serviço por um período de 35 anos. Dos treze municípios em que atua, apenas Atalaia, Marechal Deodoro e Barra de Santo Antônio têm concessão plena da BRK. Na Barra de São Miguel, Coqueiro Seco, Maceió, Messias, Murici, Paripueira, Pilar, Rio Largo, Satuba e Santa Luzia do Norte, a produção de água ainda é de responsabilidade da Casal.
Além disso, com investimentos que somariam mais de meio milhão de reais por dia, ele apresentou a construção de 13 novas ETAs (Estações de Tratamento de Água) e outras 6 reformadas, assim como 16 novas ETEs (Estações de Tratamento de Esgoto), com outras duas reformadas. E se a qualidade da água que sai da torneira for questionável, como no caso das garrafas levadas à sessão de hoje, Herbet disse que a empresa tem a obrigação de investigar todos os casos em menos de 24 horas, solicitando que a população comunique sempre que houver algum problema.
“A falta d’água é estrutural e histórica. Foi isso que viabilizou a existência do processo licitatório. A BRK está aqui para ser transformadora dessa questão, em um contrato que prevê prazos para que as coisas aconteçam, e esses prazos estão sendo cumpridos”, disse Herbet Dantas, mencionando também o aumento da oferta e situações de ligações não autorizadas. “Uma coisa de cada vez. Estamos aqui há pouco menos de dois anos, fazendo investimentos e melhorias, o que gradativamente já tem trazido alguma melhora na percepção para alguns usuários. Outros ainda não, pois depende de transformações mais estruturais”, afirmou o diretor-presidente, referindo-se aos “investimentos grandes e longos que vão levar um certo tempo, mas que, ao fim, vão levar essa transformação para a vida da população”.
Em relação à tarifa, Herbet reforçou que a tarifa foi estabelecida no processo licitatório. “A BRK pratica a mesma tarifa da Casal, reajustada ano a ano para recompor as perdas inflacionárias. Nada além disso”, justificou ele, reforçando que o aumento da tarifa ocorreu após a troca de medidores e que o valor cobrado está correto. “Temos como comprovar isso. Às vezes, um vazamento não é visível, mas durante todos os dias do mês ocorre uso de água que resulta em aumento da conta”, explicou Herbet. O diretor nega que a passagem de ar pelo hidrômetro seja o motivo do aumento da tarifa. “A responsabilidade da BRK vai até a calçada. A responsabilidade de dentro da casa até a calçada é de cada um. Da mesma forma, a água: a responsabilidade está no momento em que ela chega até o medidor. Do medidor para dentro, incluindo a limpeza da caixa d’água, é de responsabilidade do usuário”, concluiu ele.
Saneamento
O promotor da 2ª Promotoria de Justiça de Rio Largo, Dr. Magno Alexandre Ferreira Moura, disse ser muito importante a fala do público. “Todos são afetados com a questão da água e do saneamento em Rio Largo”, destacou o promotor, cobrando mais obras de saneamento e escoamento. “Temos o grande desafio: apesar da Casal fornecer a água e distribuir para a BRK, ela não está chegando em muitas torneiras. O povo tem sofrido por isso”.
Magno Moura falou ainda que muitas pessoas recorrem ao Ministério Público para reclamar também das tarifas, citando o caso de uma mãe solteira que viu sua conta mensal ultrapassar R$ 400. “Ela recebe um salário mínimo, a filha fica na escola, ela trabalha o dia inteiro e garante que não consome tudo isso. Mas a BRK disse que era a cidadã quem devia comprovar que a conta estava errada”, disse o promotor, afirmando que um procedimento investigativo do MP identificou falhas na prestação de serviço.
Presente na sessão estava o prefeito de Rio Largo e ex-deputado estadual Gilberto Gonçalves. “A qualidade da prestação de serviço é das piores possíveis”, disse ele, afirmando que teria sido muito melhor a construção de poços artesianos e o uso de caminhões-pipa – até mesmo financeiramente. “Nós queremos dizer à população que estamos nessa guerra constante contra a BRK”, afirmou o prefeito, citando casos de pessoas que precisam se deslocar para conseguir água. Dirigindo-se a Herbert, Gilberto Gonçalves questionou: “Já tomou banho hoje? Deu descarga após usar o banheiro? Lavou suas roupas e sua louça? Boa parte da população da Região Metropolitana, principalmente em Rio Largo, não”, provocou o prefeito.
“A população, sofrendo com isso, culpa até os prefeitos. Mas é uma questão muito complexa, que está sendo discutida no Supremo Tribunal Federal. Nenhum município está recebendo aporte financeiro, ninguém recebeu pela outorga. Essa situação nos foi imposta”, afirmou o prefeito de Rio Largo, dizendo que não assinou nenhuma autorização para a troca dos serviços da Casal pela BRK.
Outro prefeito presente, Márcio Lima, de Santa Luzia do Norte, questionou os números apresentados pelo diretor-presidente. “Vi na programação que uma das ETAs está programada para 2023. E isso é impossível, pois sabemos que a obra não é feita de uma hora para outra”, retrucou. Ele destacou ainda o investimento diário de “meio milhão” e imaginou que seja aplicado nas áreas nobres, ignorando a população mais carente e que oferece menos lucro para a empresa.
Já o morador Erilo Oliveira, do bairro do Jacintinho, em Maceió, disse que nada melhorou após a chegada da BRK. “Na verdade, piorou. A água falta sem a empresa nos comunicar, a água é de péssima qualidade, isso quando não ficamos uma semana sem ela”, disse Erilo, que torce por uma solução. “Espero que com essa sessão, isso desperte uma atenção maior por parte da empresa e também chame a atenção das autoridades. Eu mesmo não acredito mais na BRK, eu preferia quando era a Casal”, lamentou o morador.
Estiveram ainda presentes à sessão o vereador por Maceió e presidente da CEI que investiga denúncias da população contra a BRK, João Catunda; o secretário de Governo da prefeitura de Pilar, Paulo Santos; o presidente do Instituto Faça um Coração Feliz – Canaã, Filipe Félix; o líder comunitário do bairro Santo Amaro, Jorge Luiz Santos; a líder comunitária do bairro de Ponta Grossa, Francis Faria; a presidente da Associação dos Moradores do Trapiche, Maria Martins; e o vice-prefeito de Satuba, Luiz Carlos Lira.