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Alagoas

Construção de tanque pulmão vai garantir segurança hídrica em Piaçabuçu

A obra vai colocar em funcionamento um sistema que estará apto a abastecer a população

Em pouco tempo a população do município de Piaçabuçu, em Alagoas, terá, finalmente, tranquilidade e segurança ao consumir a água que já foi alvo de conflitos devido aos teores elevados de cloretos, em função do avanço da cunha salina. Isso porque o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF), através da empresa Target Engenharia Civil e Elétrica, contratada pela Agência Peixe Vivo, está na reta final da implantação de um sistema robusto para a reserva de água bruta, incluindo estruturas acessórias para a captação e adução de água.

A obra vai colocar em funcionamento um sistema que estará apto a abastecer a população da sede urbana do município de Piaçabuçu em um horizonte de 20 anos. O projeto adotou, como final de plano, o abastecimento de 100% da população estimada para o ano de 2041, o equivalente a 11.310 habitantes. Atualmente, a população se utiliza de um sistema deficiente, que atende parcialmente a comunidade, cerca de 61%, sendo que para a comunidade rural, o serviço é realizado por caminhões-pipa do Exército Brasileiro e pelo programa estadual Água é Vida. Além disso, a população sofre com o abastecimento de água, prejudicado pela interrupção na captação, tratamento e distribuição, devido à salinização.

De acordo com o superintendente da Secretaria do Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Alagoas (SEMARH/AL), Marcelo Ribeiro, também membro da Câmara Técnica Institucional e Legal (CTIL), do CBHSF, um conflito pelo uso da água se instalou na região, provocando sérios problemas para a população que, além da impossibilidade de consumir água de qualidade, também sofria com problemas de saúde devido ao alto teor de sal. “O conflito pelo uso dos recursos hídrico no Baixo São Francisco foi suscitado pela prefeitura de Piaçabuçu em 2016, quando acontecia uma terrível estiagem na bacia e, com isso, a população sofria com o avanço da água do mar, salinizando as águas que abasteciam a cidade. Após análise técnica, foi formada comissão processante que concluiu pela admissibilidade do conflito e, a partir daí, tentamos encontrar formas de minorar a situação dos moradores de Piaçabuçu que sofriam com a ingestão de água salobra causando uma série de problemas de saúde como hipertensão arterial, problemas renais, de visão e cutâneos, ou seja, patologias causadas pela ingestão de água com teor de sal acima do permitido. Então, a comissão concluiu que a melhor forma de melhorar essa questão seria a construção de tanque pulmão para armazenar água em períodos favoráveis, com menor teor de sal e desse modo, garantir segurança hídrica”, afirmou Ribeiro, que coordenou a Comissão Processante do Conflito de Uso instaurado no âmbito da CTIL.

A obra, que já concluiu a confecção dos tanques e segue para a fase de instalação, vai garantir a implantação de sistema de captação a fio d’água no mesmo ponto de captação atual, no Rio São Francisco; implantação de elevatória de água bruta – EEAB, incluindo fornecimento e montagem de plataforma flutuante, ancoragem e dois conjuntos motobomba; instalação de tubulação adutora de água bruta – AAB, que irá conduzir a água da nova captação no manancial até os novos reservatórios; fornecimento e implantação das instalações elétricas, conforme projeto executivo, normas e procedimentos definidos pela concessionária local de energia; implementação de painéis elétricos para funcionamento do sistema; e implantação de três reservatórios de 275 m³, totalizando 825 m³ para armazenamento de água bruta.

De acordo com o presidente do CBHSF, Maciel Oliveira, “esse é um dos principais projetos em execução do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. Proveniente de um conflito pelo uso da água em decorrência das diminuições constantes de vazão, prejudicando a qualidade da água para abastecimento da população do município, a sua mediação foi solicitada pela prefeitura de Piaçabuçu, e pela Casal (Companhia de Saneamento de Alagoas). O Comitê está investindo mais de R$10 mi, recurso oriundo da cobrança pelo uso da água, para a melhoria no abastecimento de água da população ribeirinha daquela localidade. A prefeitura e a Casal, sozinhas, não teriam esse recurso, por isso o Comitê interveio com esse investimento para melhorar a qualidade de vida da população na região do Baixo São Francisco”.

Após a conclusão das obras, o que deve acontecer nos próximos meses, o sistema ficará sob a responsabilidade da Companhia de Saneamento do Estado de Alagoas (CASAL). “Esse é um trabalho feito através da colaboração, cooperação com a Casal, que foi a beneficiária direta do novo sistema, e temos todos os motivos, agora, para comemorar vendo o projeto entrando para a reta final. O que o Comitê tem realizado em Piaçabuçu é uma forma de solucionar de modo permanente o problema que atinge a saúde pública, onde as pessoas não vão mais correr o risco de contrair doenças pela ingestão da água. Em segundo lugar, é importante suscitar que nós definimos essa intervenção em função da última estiagem que o rio São Francisco passou e causou vários problemas para diversas localidades, a exemplo também da comunidade indígena Kariri Xocó, em Porto Real do Colégio(AL), onde outra iniciativa foi adotada pelo Comitê – a construção do sistema de captação de água para abastecimento que vai beneficiar mais de quatro mil pessoas. Isso forma um capítulo importante do uso dos recursos da cobrança da água. Apesar da pequena escala de recursos que o Comitê dispõe, mostra que é possível”, completou o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Baixo São Francisco, Anivaldo Miranda.

Salinização da água

De acordo com o professor da Universidade Federal de Alagoas e coordenador da Expedição Científica no Baixo São Francisco, Emerson Soares, o problema de salinização da água do rio São Francisco ocorre a partir das construções das hidrelétricas que formam barramentos na bacia e diminuem a vazão da água, fazendo com que ela perca força no encontro com o mar. “Desde a implantação das hidrelétricas na bacia do São Francisco, o que foi um dos maiores desastres para o Baixo São Francisco, até a retenção de água pela Hidrelétrica de Xingó com a redução das vazões que a cada ciclo de ano, vem sendo reduzida de acordo com a climatologia, a gente tem observado o avanço do mar em direção ao continente, o que já ocasionou um processo erosivo de cerca de 3 km. Essa retenção de água pela UHE de Xingó proporcionada pelo sistema de retenção de água em Sobradinho e Itaparica provoca fortes impactos na região do Baixo. Os níveis de cloreto, potássio, cálcio, magnésio, os níveis de condutividade elétrica, o teor de sal vem aumentando significativamente, inclusive a salinidade em períodos mais críticos de diminuição de vazão, chega a avançar até 16 km da foz, atingindo a cidade de Piaçabuçu, que está totalmente refém desse sistema de vazões”, explicou o professor.

Segundo ele, quanto mais profundo, maior o teor de sal, que para consumo humano deve estar abaixo de 0,5ppm de salinidade. “Já chegou a se constatar até 5ppm de salinidade da água. Agora, temos um maior volume de água devido às chuvas, mas quando voltarmos a ter reduzida a vazão no rio, a salinidade volta”, completou, lembrando que o problema também afeta os manguezais e a agricultura da região. “Os manguezais aguentam certos níveis de estresse, mas com os altos teores de sal, também temos verificado problemas nessas áreas e também na agricultura da região”.