Iniciativa foi responsável pelo apoio a nove curtas-metragens
O baixo protagonismo de mulheres no cinema foi um dos pontos levantados e discutidos no debate Brasília Debate Cinema de Mulheres, conversa que reuniu mulheres, entre organizadoras de festivais e cineastas brasilienses, para a discussão da presença feminina no mercado audiovisual não apenas de Brasília, mas do Brasil de modo geral. O debate foi realizado na noite dessa quarta-feira (31), no Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília, em meio à Mostra Edital Carmen Santos – Cinema de Mulheres e Filmes Convidados, que segue até 4 de abril no local.
Para a diretora do filme Das raízes às pontas, Flora Egécia, as mulheres, negras principalmente, são sempre estereotipadas ou sexualizadas nas produções audiovisuais. “Como espectadora, sempre me vi muito pouco representada. Isso está melhorando, mas até hoje me vejo muito pouco representada – como mulher e como negra. Como mulher, eu sinto muita falta do olhar feminino. E quando eu digo isso me refiro à ausência de personagens que não foram necessariamente esculpidas pelo olhar masculino. E como negra, eu vejo a minha cultura anulada na TV e no cinema”, disse.
“As pessoas falam que não tem mulher negra fazendo cinema ou que elas são muito poucas. Essas pessoas existem, mas a visibilidade é pequena porque o acesso a recursos ainda é insuficiente. Sabemos que na área há uma rede de contatos essencial para que se consiga financiamento e as mulheres negras estão mais distantes desse núcleo”, afirmou Bruna Pereira, coordenadora do Festival Afrolatinidades. Para ela, existe ainda muito preconceito e persiste a ideia de que filmes com mulheres negras à frente da tela não vendem bem. “Somos a maior parte da população, então eu acho muito difícil que a gente não queira se ver ali”, afirmou.
Um relatório da Agência Nacional do Cinema (Ancine) divulgado em janeiro deste ano mostrou que, dos 128 longas-metragens nacionais lançados em 2015, apenas 19 foram dirigidos unicamente por mulheres, uma fatia que representa menos de 15% do mercado comercial do audiovisual brasileiro.
Luisa Caetano, diretora do filme Entre vãos, chegou a afirmar que políticas públicas afirmativas são fundamentais para equilibrar este mercado e fomentar a produção de filmes feitos por mulheres. Nesse contexto, ela destacou a importância do edital Carmen Santos. “Editais como este são importantíssimos, pois cobrem a produção de filmes de mulheres e que falam com mulheres. Mas, mais do que isso, o Carmen Santos merece destaque por ter fechado esse circuito com a mostra, algo já mais voltado para a distribuição. Até mesmo porque nós sabemos que o filme começa muito antes da produção e termina muito depois da sua distribuição, quando, por meio da recepção, ele passa a reverberar no público que o assiste”, disse.
Também participaram do debate Tânia Fontelene, diretora do filme Poeira e Batom no Planalto Central; Ana Arruda, coordenadora do Festival Curta Brasília; Letícia Bispo, diretora e roteirista de O sal dos olhos, e Amanda Devulsky, diretora de Querido Capricórnio.
Além desse bate-papo, também será realizado durante o festival o Debate com Diretoras da Mostra. O encontro discutirá, nesta sexta-feira (1º), a importância de ações voltadas para mulheres no audiovisual e o processo de produção de seus filmes. O debate, gratuito e aberto ao público, será realizado logo após a sessão das 19h da mostra.
A mostra
Com sessões até 4 de abril, a Mostra Edital Carmen Santos – Cinema de Mulheres e Filmes Convidados apresenta curtas e médias-metragens apoiadas pelo edital Carmem Santos, lançado pelo MinC em 2013, além de longas dirigidos por mulheres. Entre eles, Que horas ela volta?, de Anna Muylaert; Califórnia, de Marina Person; e Olmo e a gaivota, de Petra Costa.
As sessões ocorrem às 17h, 19h e 21h (segundas, quartas, quintas e sextas-feiras) e às 16h, 18h e 20h (sábados e domingos).
A iniciativa é do Ministério da Cultura (MinC), por meio da Secretaria do Audiovisual (SAv); do Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília (CCBB/Brasília) e da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.
Edital Carmen Santos
O Edital Carmen Santos foi lançado em 2013, resultado de parceria entre SAv/MinC, SPM e Empresa Brasil de Comunicações (EBC). Ele teve como objeto obras audiovisuais dirigidas por mulheres, podendo ser ficção ou documentário, com técnicas de animação ou não.
A iniciativa foi responsável pelo apoio a nove curtas-metragens de cinco minutos e seis médias-metragens de 26 minutos. Os filmes tiveram em suas equipes mulheres ocupando quase todas as funções e tratam de diversos assuntos, como o empoderamento feminino, sexualidade, estereótipos de gênero e violência contra a mulher, entre outros.
“Esta é uma iniciativa que merece ser destacada e replicada, para seguir incentivando e dando visibilidade à atuação das mulheres no universo do audiovisual”, elogiou Angélica Valente, diretora do média De menino, de menina.
