Roberta Dias foi sequestrada e assassinada em abril de 2012
Entre os dias 23 e 25 de abril, o Fórum Desembargador Alfredo Gaspar de Mendonça, em Penedo, será palco de um dos julgamentos mais aguardados e revoltantes da história recente do estado. Estarão no banco dos réus Karlo Bruno Pereira Tavares, conhecido como “Bruninho”, e Mary Jane Araújo Santos, acusados de participação no assassinato da jovem Roberta Costa Dias, ocorrido em abril de 2012.
Roberta tinha apenas 18 anos e estava grávida de três meses quando desapareceu. De acordo com o Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL), a jovem foi morta por não aceitar interromper a gravidez de um relacionamento com Saullo de Thasso Araújo dos Santos, filho de Mary Jane. A ossada da vítima só foi encontrada nove anos depois, em 2021, na Praia do Pontal do Peba, município de Piaçabuçu.
O caso que se arrastou por mais de uma década teve grande reviravolta anos atrás após o vazamento de um laudo técnico da Polícia Federal, produzido a partir de uma gravação de áudio periciada ainda no ano de 2016. O documento contém uma confissão detalhada feita por Karlo Bruno, que revela passo a passo como o crime foi premeditado e executado com frieza.
Diálogo gravado revela detalhes cruéis do crime
Com cerca de 16 minutos de duração, o áudio foi analisado pela Polícia Federal após ser enviado pelo delegado Cícero Lima, responsável pelo inquérito. No diálogo, Karlo Bruno admite que matou Roberta para ajudar o amigo Saullo, que não queria assumir a paternidade por medo da reação do pai.
“Ele disse assim: ‘Rapaz, ela tá grávida e tudo… não sei o que fazer, tô lascado se meu pai descobrir’. Teve um dia, nesse meio tempo, que a mãe dela [Roberta] chegou na casa dele. Tinha um monte de meninas lá, Roberta estava no meio. Quando a mãe dela chegou, pensei: ‘agora deu ruim’. Aí ela perguntou: ‘cadê sua mãe?’. Ele gaguejou e respondeu: ‘acho que ela não tá não, mas deixa eu ver aqui’. Foi quando a mãe dele já estava saindo. Aí disse: ‘Opa, que foi? Já tá sabendo que a senhora vai ser vovó?’. Foi aí que tudo começou a desandar”, relatou Karlo Bruno.
O jovem segue descrevendo como o crime foi arquitetado:
“Quando foi no outro dia, ele me procurou e disse: ‘Bruninho, fu***’. Eu falei: ‘Oxe, bicho… o que é problema pra você pode ser pra mim também’. Aí ele perguntou: ‘Tem coragem? Assim, assim, assado?’. Eu respondi: ‘Rapaz, a gente faz. Coragem não falta pra nada. Agora é saber fazer’. Aí ele disse: ‘Pronto, qualquer coisa eu falo com você’. Eu tava no ponto, esperando pra ir pro cursinho em Arapiraca, aí ele chegou e perguntou: ‘Bora hoje?’. E eu, já ligado no que era, disse: ‘Bora!’. E fomos pra casa dele.”
Planejamento e execução do crime
Ainda segundo o áudio gravado, após o plano ser definido, retiraram o som da mala do carro e pegaram uma pá, uma enxada e um fio de extensão elétrica — que seria a arma usada para matar Roberta.
“Eu disse pra ele, quando você parar deixa comigo. Ele disse: Bruninho paro onde mais ou menos? Bicho, tem que ser num canto longe. E decidimos ir para perto do Balneário Santa Amélia. Ele foi buscar ela e eu na mala. E ela entrou, não sei o quê, conversando com ele de safadeza. Ai quando eu senti o carro parar, dei aqui a volta logo assim na mão. Estiquei assim o fio, mais ou menos que eu sabia que dava pra garantir no pescoço dela e, nesse assento assim, no apoio de encostar a cabeça né. Vou logo botar, digo não, ói, vou devagarzinho aqui ó. Quando tirei um pouquinho, eu digo, tá, eu vou é ligeiro ai fui. Ela ainda olhou pra mim e disse: Bruno, calma! Eu tiro (referindo-se ao bebê que carregava em seu ventre). Essa cena é a que ficou mesmo aqui”, declarou.
Roberta ainda tentou se salvar:
“E eu queria mais saber de nada. Larguei-lhe a volta aqui no pescoço, dei outro. E ele nervoso. Vamos soltar essa peste aí, eu digo, você é doido, é? Você é doido, car***o não sei o que. Ai ele, não, não, vamos embora, deixe esse cra*** ai. Eu digo: Homi, tenha calma. Só se ligue se vem alguém aí, que vira e mexe, ali tem uns vigias. E eu apertando no guarguelo. Ai demorou né, um pouquinho, uns cinco minutos, eu acho. E ela com os braços assim, se batendo”, explicou.
O laudo da gravação mostrou também que, segundo o que foi dito pelo próprio Karlo Bruno, enquanto ele enforcava Roberta Dias, Saulo Araújo segurava em seus braços. No entanto, quando a vítima já estava sem forças, Bruno pediu que o comparsa fosse para o banco de trás e continuasse enforcando a jovem com o fio, enquanto ele assumia o controle do veículo.
“Acho que ali já era a morta. Não voltava mais não. Mas, eu queria um negócio garantido. Eu olhava assim pra ela e olhava pro Saulo. Ficou preto os olhos dela. Aquela frase que ela disse: Bruno, tenha calma, eu tiro. E aquela cena dos olhos pretos marcou”, acrescentou.
Plano macabro: arrancar dentes e cabelos da vítima
Por decisão de Karlo Bruno, a dupla seguiu em direção ao Pontal do Peba com o corpo da vítima. Karlo Bruno conta com riqueza de detalhes que antes de enterrar a jovem em uma cova feita por ele e seu cúmplice, pensou em arrancar sua arcada dentária e seus cabelos para dificultar a identificação do cadáver, caso o mesmo fosse encontrado. Quando questionado se tinha ficado com a consciência pesada, Karlo Bruno declarou:
“Fiquei. Não pelo o que eu fiz. Assim, não na atitude de matar alguém. Mas da atitude de dizer que matei por uma besteira.”
Celular de Roberta Dias
Ainda no diálogo, Karlo Bruno assume que foi ele quem jogou o celular da vítima dentro de um terreno de uma residência situada nas proximidades da Rodovia Engenheiro Joaquim Gonçalves, no bairro de Santa Luzia, parte alta do município de Penedo.
Recompensa
Karlo Bruno é questionado também se chegou a receber algum valor para cometer o crime. Ele nega. Segundo o próprio, o homicídio foi cometido por amizade, apenas para ajudar Saulo Araújo. Ele disse ainda, antes de encerrar sua confissão, que não tinha interesse em se entregar e que, mesmo a polícia descobrindo a autoria do assassinato, assumiria tudo sozinho.
Família clama por Justiça
Para Mônica Reis, mãe de Roberta Dias, o julgamento dos acusados é a oportunidade se fazer Justiça a um crime bárbaro cometido contra uma jovem indefesa, grávida, que sofreu tamanha violência simplesmente por decidir que não queria fazer um aborto.
“São treze anos de dor, de silêncio e de luta. Treze anos em que vivi com a angústia de não ter respostas. O tempo não apagou a saudade, nem diminuiu a dor. O que me manteve de pé foi a certeza de que a verdade um dia viria à tona — e esse dia chegou. Ver os acusados sentados no banco dos réus é como abrir uma ferida que nunca cicatrizou, mas também é um passo necessário para que a justiça seja feita. Não existe justiça que traga minha filha de volta, mas existe a justiça que dá nome aos culpados e mostra que a vida de Roberta e de seu filho não foram em vão. Quero olhar nos olhos de quem fez isso e dizer que minha filha tinha sonhos, tinha planos, e carregava uma nova vida no ventre. Que eles não tiraram apenas uma jovem de 18 anos, mas também um pedaço de mim, e de todos que a amavam. Agora, é hora de respostas. É hora de justiça. Que a verdade prevaleça, que os culpados sejam responsabilizados, e que nenhuma outra mãe precise passar pelo que eu passei”, declarou Mônica, em tom emocionado.
