
Sociólogo Jorge Vieira expõe que ainda não sabemos lidar com o novo e desconhecemos a sua importância
Nos últimos dias a população de Penedo se viu em polvorosa, não apenas pelos homicídios na zona urbana. Mas, também pela quantidade de boatos espalhados pelas redes sociais, sobre mortes que estariam acontecendo simultaneamente. Como também, possíveis confrontos armados entre suspeitos de bairros distintos.
O resultado: pânico, medo e o trabalho policial sendo prejudicado. Além de estragos econômicos e turísticos. Como o ocorrido no primeiro dia da Gincana de Pesca. Dois áudios foram divulgados pelas redes sociais, com vozes diferentes, afirmando que iria acontecer um confronto armado entre suspeitos do Camartelo e ‘Barro Vermelho’. Ao fim, nada aconteceu e o bloco que abre a festa, foi totalmente esvaziado. Prejudicando a economia da cidade. Se o evento foi esvaziado pelo temor de confronto, milhares de pessoas deixaram de fazer circular capital em todo o festejo, marcada para iniciar às 20hrs, com previsão de encerramento por volta das 02hrs da madrugada.
Os prejuízos são incalculáveis para todos os segmentos da sociedade. E o mais recente viral que circulou pelas redes dos penedenses, foi sobre a morte do estudante Gustavo Carvalho, 18 anos (ocorrido dia 22). Inconsequentemente teorias foram lançadas por meio de fotos contendo comentários, áudios gravados (em anexo) e postagens no Whatsapp e Facebook. A mais grave acusação apontava erro médico para profissionais da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Penedo. Eles teriam aplicado uma medicação causadora de um choque anafilático (reação alérgica, de hipersensibilidade imediata e severa, que afeta o corpo todo. A sua manifestação provoca inchaço e obstrução de vias aéreas), resultando na morte do jovem.
A família do estudante não se manifestou oficialmente, nem o Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Penedo, onde Gustavo faleceu por causa clínica. O jovem estava internado desde terça-feira (18) na unidade e em momento algum, teve passagem pela UPA de Penedo. O médico generalista e cirurgião, Raimundo Rosário, disse que atendeu o paciente em primeira consulta, quando existia a suspeita de apendicite. Descartando, o caso foi repassado para outro médico da Santa Casa. A família tem todo o direito de não querer se posicionar por questões particulares. O caso não é público e não podemos invadir o seu espaço.
A consequência dos boatos, sem checar a veracidades dos fatos, foram milhares de comentários pejorativos, caluniosos, depreciativos contras os profissionais da unidade hospitalar administrada pelo poder Executivo do município. O que pode incidir em processo, para quem deu publicidade às acusações difamatórias.
“Todas as pessoas que falam nas redes sociais assumem a responsabilidade pelos seus atos. Podem ser acusadas de crimes contra a honra. Podendo responder na esfera Criminal por calúnia, difamação ou injúria. Isso dependendo do caso. Na esfera Cível, por danos morais”, explicou o advogado militante Antônio Carlos.
O operador do Direito ainda acrescentou que a pessoa que dá publicidade também pode responder, no caso das redes sociais, os chamados compartilhamentos. “A culpa pode ser imputada não apenas para quem escreve, mas também para quem dá publicidade. Quem divulga, compartilha. Você tornou público algo reservado. Logo, também poder ser representado. E com às redes sociais, quem escreve, publica e, ou compartilha, constitui prova contra se mesmo. Basta apenas imprimir a postagem, ou um simples printscreem para usar na peça judicial”, observou.
Com relação aos comentários contra a UPA (funcionários), foi imputado culpa em algo inverídico. Podendo a pessoa que deu publicidade ser acionada na Justiça, através da Procuradoria do Município, cabendo uma ação indenizatória por difamação.
Confronto? Trabalho da polícia prejudicado
Nos dezenas de virais que circularam em Penedo nos últimos dias, um narrava que haveria um confronto entre suspeitos do Camartelo e ‘Barro Vermelho’, o que terminou por mobilizar a PM e causar pânico aos alunos da Faculdade Raimundo Marinho. Com medo, estudantes por conta própria abandonaram aula neste dia. E mais uma vez, nada aconteceu. A quem interessa espalhar o pânico no município, aos traficantes, aos bandidos.
“Os boatos atrapalham muito o nosso trabalho. Com a divulgação, mobilizamos homens de um trabalho, para averiguar outro, quando na verdade, tudo não passou de um boato. No caso deste do confronto, mobilizamos guarnições de outras localidades para dar suporte na região que fica localizada uma faculdade. Mandei vir uma equipe de Piaçabuçu e outra de Igreja Nova. Deixei lugares descobertos por causa de um boato, buscando dar proteção aos alunos e à comunidade do entorno. E nada aconteceu. Então, peço aos moradores de Penedo que não entrem em pânico e deixem de compartilhar, replicar inverdades. Isso só interessa aos criminosos. Se você descobre um lugar para atender um falso chamado, o criminoso pode ficar com a área livre para praticar o delito naquele local. Quer ajudar, não dê publicidade aos boatos e façam denúncias. Desta forma, nosso serviço de inteligência filtra as informações para ver o que realmente pode ser investigado”, alertou o comandante do 11º Batalhão de Polícia Militar (BPM) de Penedo, o major Joanilson Sampaio Júnior.
Não sabemos lidar com o novo
Para o sociólogo e doutor pela Universidade de Grenoble, na França, Jorge Vieira, ainda não sabemos lidar com o novo. E, desconhecemos totalmente o papel transformador das redes sociais e sua importância no processo de comunicação.
“A grande questão é que as pessoas não sabem o papel, a importância das redes sociais. Nós somos uma nação nova, com 514 anos, se comparados a países europeus. Só para ter ideia, Gutenberg criou a prensa em 1455, e só com a chegada da família real em 1808, que tivemos acesso ao jornal. Então, às redes sociais ainda são vistas como brinquedo. Com isso, vários problemas por não saber da sua importância estão surgindo. O resultado, a falta de respeito, o individualismo, a inversão entre o público e o privado. Tudo que vem na cabeça revolvem exprimir sem medir consequências, responsabilidades”, frisou o sociólogo.
Jorge Viera concluiu defendendo o processo por reparação, em caso de desconstrução do ser, da honra: “Qualquer pessoa pode entrar com uma ação por reparação. Enquanto estudioso das questões sociais, defendo que as pessoas procurem à Justiça, como uma ação de defesa”.
* No áudio do topo, apenas três boatos dos dezenas espalhados no dia que o jovem faleceu.