Interagimos no contraste hipnotizante entre a pele bronzeada e a marca do biquíni e, até, na sensualidade gestual entre o sorvete e a lambida
O verão é, sem dúvida, uma estação bastante peculiar e começa na próxima sexta-feira (21). Alterações no comportamento humano são evidentes à luz do sol e da lubricidade das noites quentes. O calor acentua toda a sensualidade dos corpos cada vez mais desnudos, suados e lascivos, dispostos a ratificar que: se a roupa faz o homem, quanto menos há do homem mais roupa ele necessita. Portanto, é no verão que o homem é mais homem, e a mulher, magneticamente, mais mulher. É temporada da libido e prurido em alta, nos países tropicais. Seres, uns devorando os outros. O Brasil é inigualável, dá de goleada neste quesito. Afinal, temos um litoral exuberante e fazemos o melhor carnaval do mundo que, não por acaso, acontece no verão. Já pensou por que nossa festa pagã acontece no verão? Simples: esta é a estação da libertinagem, da liberdade, do ninguém é de ninguém, do calor por dentro e por fora. Os hormônios agitados e bronzeados ficam à flor-da-pele, irresistíveis como uma deliciosa cerveja gelada, efervescentes e embriagadores como um beijo após um gole do champanhe climatizado. Ou, por que não? Após uma saborosa caipirinha feita na medida exata, onde tudo se amálgama em uma combinação que, de tão perfeita, não percebemos as partes, posto que o todo prevalece.
Sendo o Brasil um país de clima tropical, acho que nossas cidades litorâneas – ao contrário de outros países – fazem da confluência de diversos fatores o todo que de fato determina a chegada do verão. As alterações climáticas, a partir deste ponto de vista, são meras coadjuvantes. Tomemos como exemplo nosso aquário, Maceió, ou até mesmo Penedo. Aqui, o sol brilha incansável praticamente o ano inteiro e, embora oficialmente o verão só comece na próxima-sexta, 21 de dezembro, na verdade, são as mudanças de hábitos e comportamentos que de fato determinam a percepção da temporada de verão. A capacidade das pessoas relaxarem estando de férias ou não, a roupa que usam, o esporte que praticam, o entretenimento ofertado, a música que rola na temporada, o fluxo turístico, tudo isso é, de fato, o verão.
Afinal, que graça teria se o verão fosse apenas uma mudança de estação? Nenhuma! Teríamos somente (e temos, é bem verdade) o estressante calor, a impaciência da cabeça fervendo sob o sol a pino, o desconforto do suor correndo em bicas e, talvez, uma vontade irracional de ter nascido hipopótamo. Ainda bem que, para ser realmente verão, é fundamental e necessária a interação humana. Eis a estação perfeita para isso. Interagimos pelo sorriso mais espontâneo que o verão possibilita, interagimos com a sensualidade feminina das cores, brilhos e andores à beira-mar e calçadão. Interagimos no contraste hipnotizante entre a pele bronzeada e a marca do biquíni e, até, na sensualidade gestual entre o sorvete e a lambida. Porém, reagimos (pelo menos eu, um nativo) com impaciência ao trânsito caótico na orla. Aos bares lotados e com péssimo atendimento, a ter que ir trabalhar quando queríamos sombra e água fresca (ou sol e banho de mar), às quedas de energia na alta temporada e, finalmente, à incompetência das autoridades diante do caos anunciado, todos os anos, com as chuvas de verão.
Simone de Beauvoir escreveu que “a mulher que exerce apenas atividades domésticas está condenada a refazer diariamente um trabalho que jamais se concretiza, pois se desfaz cada vez que é refeito.” Pois é exatamente assim que estou me sentindo agora (escrevendo estas reflexões), refazendo o que fiz antes, ao invés de estar de papo pro ar na praia quase deserta que costumo ir, onde nunca e sempre é verão.
