Spike Jonze é admirável por conseguir equilibrar filmes que consigam ser comerciais mas ao mesmo tempo reflitam sua livre visão nada convencional, resultando em filmes esquisitos porém muito interessantes como Quero Ser John Malkovich e Adaptação. Talvez com o intuito de colocar em prática seu estudo do bizarro comportamento humano, Jonze também foi co-criador e produtor da série de TV Jackass.
Em Onde Vivem os Monstros, Jonze conseguiu uma proeza mais admirável ainda. Transformar pouco mais de dez frases do livro no qual é baseado (escrito há quase 50 anos por Maurice Sendak) em um longa profundo e que nos dá uma visão nunca antes vista no cinema da mente de uma criança, através de seu personagem principal, Max.
Max é uma criança comum: na escola, brinca com os colegas; em casa, busca a atenção da mãe e da irmã e, quando falha em consegui-la, se sente frustrado. Tem medo e chora ao ser soterrado num banco de neve depois de uma brincadeira. Ao ser repreendido pela mãe, reage de maneira impulsiva, machucando-a, arrependendo-se imediatamente do que fez. Sem compreender a melancolia e a seriedade do mundo adulto, ele constantemente se volta para seu rico universo interior, usando a imaginação não apenas para se divertir, mas também para fugir daquilo que o incomoda. A partir daí, Max foge de casa e refugia em sua imaginação em uma ilha com imensos monstros peludos.
E o filme é tudo menos o que aparenta ser: um filme infantil com monstros assustadores. Eu realmente não recomendaria que crianças o assistissem. O filme acaba revelando-se uma profunda análise psicológica do comportamento infantil, seus medos, suas dúvidas e seus conflitos em relação ao conturbado mundo dos adultos.
Ambientado em um clima opaco, triste, pouco iluminado e muito pouco colorido, prezando por tons de cinza e ocre, com monstros que à primeira vista parecem assustadores mas que ao longo da projeção revelam-se cativantes e confusos, Jonze consegue que mergulhemos na imaginação de Max com uma fantástica direção de arte que traduz o ar de melancolia e confusão de sua mente.
Aos poucos percebemos que cada monstro na verdade reflete um traço específico de sua personalidade, Max acaba se envolvendo em problemas com cada um deles e tenta fugir daquele que aparentemente reflete o seu pior traço pessoal, ironicamente o mesmo que o levou a fugir de casa: a insegurança e carência de atenção. Vemos então Max tendo que enfrentar seus próprios problemas pessoais personificados nos monstros criados em sua imaginação.
A partir daí o filme começa a se tornar perturbador, sombrio e ao mesmo tempo belo e cativante, por sua naturalidade, com monstros realistas (construídos com o misto de atores fantasiados e computação gráfica para as expressões faciais) fugindo da artificialidade e revelando claramente a personalidade de cada um, tudo embalado com uma exótica e maravilhosa trilha sonora.
Onde Vivem os Monstros nos faz voltar ao que sentíamos na infância e a analisar o comportamento humano em sua fase mais conturbada, mostrando, ao mesmo tempo, a relação dos pais com seus filhos em uma sociedade tão voltada para o lado material. Max ao fugir de casa, refugia-se em seu mundo particular para conhecer e enfrentar seus próprios problemas tudo dentro de sua imaginação. Ou será que não? …