×

Chorando Penedo

Hoje, quero chorar Penedo. Chorar de dor, de revolta, de saudade e de vergonha.

Chorar Penedo com a angústia que oprime o meu peito feito garra que aprisiona e humilha.

Hoje, quero chorar Penedo debruçada sobre a pedra fria do seu rochedo que indiferente e impávido, apenas me contempla deixando transparecer no brilho dos seus pontos tremulantes de luz a silenciosa compreensão da sabedoria.

Choro de saudade da Penedo da minha infância onde dei meus primeiros passos.
Da Penedo de minha adolescência em cujas paredes dos sobrados ainda ecoam os gritos de protesto da minha juventude. Percorro Penedo a passos lentos, mas com o coração ofegante e a alma ritimada pela cadência da desilusão.

Sei que muitos amam Penedo, penedenses e não penedenses cujas raízes estão fincadas nessa terra que guarda as marcas da história do nosso país. Eu também amo Penedo e posso dizer que amo Penedo ainda mais do que muitos que fazem de Penedo apenas uma referência em suas vidas e que voltam, quase sempre, para criticar aqueles que aqui ficaram a construir uma cidade que não se traduz apenas em eventos periódicos dos quais os que estão “de fora”, participam.

Os que amam Penedo e que aqui permancem, os que aqui cumprem sua rotina diária, investem o que ganham, constroem tijolo a tijolo essa cidade, vivenciam um cotidiano de batalhas que precisam ser vencidas. E é essa Penedo que parece ter sobrevivido a um grande bombardeio.

Percorro uma Penedo esfacelada, açoitada pela incompetência, pelo descaso, pela falta de planejamento e seriedade na aplicação das políticas indispensáveis ao seu crescimento e desenvolvimento.

Pelas ruas, praças e avenidas, obras que não têm fim estão expostas como um fiel retrato dos açoites dos quais Penedo tem sido vítima.

E não me digam que são obras para a melhoria da cidade porque não haverão de me convencer. Em Penedo, a verdade é que as chamadas “obras”, têm se caracterizado por destruir o que já existe, desperdiçando o dinheiro público, para construir a cada gestão, uma nova imagem.

E assim, a histórica cidade de quatrocentos anos não sabe até hoje quem é e para onde vai.

Exemplos não faltam e a orla de Penedo é o mais gritante.

Em 1998 a Prefeitura gastou dinheiro público para derrubar antigos prédios e construir bares, restaurantes e uma “feira do barro” com o objetivo de criar melhores condições para atender ao turista.

Em 2002, a Codevasf presenteou Penedo com a construção de um grandioso projeto que em sua primeira etapa mostrava a dimensão do que seria a nova orla da cidade.

Em qualquer cidade tombada pelo patrimônio nacional, principalmente por causa de sua arquitetura colonial, uma dúzia de anos pode até representar muito pouco, mas aqui é tempo suficiente para que se por abaixo tudo o que foi sonhado e construído com dinheiro público em nome de, mais uma vez, criar o novo, destruir sua identidade ou mascarar vergonhosas atitudes.

Enquanto isso, dezenas de logradouros públicos carecem de, ao menos, retirar o mato.

Penso que os gestores públicos são exatamente iguais aos comandantes do Comando Militar do Império no episódio da famosa Retirada de Laguna, uma fragorosa derrota na Guerra do Paraguai. Eles não sabiam nada da terra, da geografia, da topografia, do povo, dos costumes, tinham poucos víveres e mesmo assim decidiram invadir o Paraguai.

Os gestores públicos atuais também parecem ignorar a geografia da cidade, a necessidade do povo e seus anseios e talvez por isso sejam, assim como o comandante da Retirada da Laguna, acusados de traição.

Traem a cidade, seus soldados, o povo e desrespeitam sua identidade. Destroem tudo o que podem em nome de seriedade na utilização do dinheiro público.

No mês em que se comemorou os 20 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente, uma máquina destruiu o parque infantil da orla. E a Constituição diz que criança é prioridade e que elas têm direito ao lazer.

Ignoram as carências da comunidade e acham que todos os moradores da cidade vivem seus momentos de descanso e lazer na orla e por isso não investem em praças, parques, arborização e melhorias nos bairros e povoados.

Isso sem falar que, irresponsavelmente, assumem compromissos que não podem cumprir em nome de projetos que não são discutidos com a sociedade e que não observam as leis e as tradições da cidade.

Querer colocar a feira de Penedo em galpões para construir o novo Forum na Lagoa do Oiteiro é uma dessas atitudes e o futuro vai comprovar essa insensatez.

É também por isso que choro Penedo. Pela frustração dos sonhos que vi e testemunhei serem sonhados e que foram traídos.

Pela cidade que só se desenvolve porque cidadãos e empresários dessa cidade, pequenos comerciantes, cada um a seu modo, continuam lutando e construindo, independentemente da desídia política e da incúria administrativa que deixam marcas nessa linda e histórica cidade.

Choro Penedo na indiferença de suas ruas, soluçando por suas esquinas, tropeçando nas pedras originais do seu calçamento retiradas pelos ignorantes e levadas pelos “amoladores de faca”.

Choro Penedo e lhe peço perdão. Em 52 anos de vida e 25 anos de microfone, apesar de minhas lutas e de minha voz, nada consegui mudar.

Migramos da “terra do já teve e já foi” para a terra do “faz de conta”.

Faz de conta que temos educação, faz de conta que temos saúde, faz de conta que temos limpeza, faz de conta que temos seriedade, faz de conta que temos segurança, faz de conta que temos competência e por aí vai.

De tanto faz de conta, em breve teremos à disposição dos guias turísticos para contar aos turistas, o CONTO DA BRUXA, porque as fadas, essas nos abandonaram há muito tempo e as Deusas que sobraram estão no topo de Teatro 7 de Setembro assistindo a tudo, de camarote.

E quando vejo a chuva carregar ruas abaixo a areia, a pedra, o cimento, penso que assim como algumas obras, as palavras também deixam de ter sentido.