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À Vida, com carinho…

Desde o tempo dos temidos “Papa-Figos” que, de forma indireta, todos nós falamos sobre transplante de órgãos. Quando crianças, temíamos o sinistro “Jipão”, aliás, um recurso usado pelos nossos pais para, através do medo, nos impedir de sair às ruas à noite e continuar as brincadeiras que ocupavam nosso tempo quando não assistíamos ás aulas ou executávamos nossas tarefas diárias.
Naquele tempo achávamos que os homens vestidos de preto do “Jipão” pegavam as crianças e arrancavam-lhes o fígado e outros órgãos. Em nossa fértil imaginação infantil, acontecia um tenebroso “tráfico de órgãos humanos”.
Crescemos e a luz da informação iluminou os esconderijos de nossos pensamentos, mas receito que, de alguma forma, muitas mentes ficaram povoadas de medos que resistiram ao tempo e que se transformaram em ignorância e preconceito.
Nesse final de semana, o Ministério da Saúde lançou uma campanha nacional para incentivar a doação de órgãos que tem como slogan “A vida é feita de Conversas. Basta uma para Salvar Vidas”. E talvez seja mesmo isso que falte para que tanta vida desperdiçada, sepultada sobre palmos de terra, possa novamente atender ao chamamento da natureza e da ciência.
Não somos pó, somos vida. O mais fantástico enigma da natureza. Então, por que desperdiçar esse tesouro tão precioso?
O que amamos nas pessoas não é o fígado, o pulmão, o coração, as córneas, os rins, a medula. O que amamos é o sorriso, o gesto, o brilho dos olhos, os pensamentos, a forma de enxergar o por do sol e o desabrochar das flores, elementos que um simples corpo inerte, vegetativo, não pode nos proporcionar. Então, por que não doar?
Segundo pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde, 60% dos brasileiros dizem que são doadores. Na hora “H”, aparecem apenas 8,6 doadores para cada um milhão de habitantes. Talvez, o que falte mesmo, seja uma boa conversa sobre nossos medos que ficaram escondidos e nossa necessidade egoísta de chorar sobre corpos inertes ao invés de agradecer pela oportunidade de ter compartilhado o dom extraordinário da vida.
Mais que um gesto de amor, a doação de órgãos é um gesto de responsabilidade para com a manutenção da obra de Deus.
Ah! No caso das minhas córneas, tem que se verificar as limitações da minha miopia. Mesmo assim, se alguém um dia as receber, tenho a certeza de que verá o brilho dos raios do sol bailando nas águas cálidas do meu Velho Chico.