Cresci em tono do Mercado Público de Penedo e do Pavilhão da Farinha. Aos oito anos, quando saímos do Sítio Araçá e passamos a morar em Penedo, na Travessa Professor Henrique Thomaz, número dois, minhas tardes de quarta a sábado eram vividas no entorno do Mercado, na feira livre, onde limpava e arrumava verduras nas bancas de “Seu” Otacílio, o Oxis, de dona Maria, “Seu” Virgílio e dona Virgínia. Pela manhã eu frequentava as aulas no Grupo Escolar Gabino Besouro e a partir das quartas-feiras, quando começavam a chegar os caminhões com as cargas de Itabaiana, em Sergipe, eu começava meu trabalho de lavar cenouras, batatas, chuchus, tomates, limpar cebolas, tudo para deixar as bancas arrumadas e atrativas para os consumidores. Era assim que ganhava um dinheirinho de muita serventia para ajudar minha mãe e também verduras e frutas.
Do dinheiro que ganhava, uma parte era entregue à minha mãe para ajudar nas despesas da casa e outra parte era para alugar bicicleta na oficina do Edivaldo e comer creme no “Seu” Oscar.
Junto com meus amigos de infância, que também moravam nas redondezas, percorríamos aquele entorno na seriedade de fazer os mandados que nossas mães determinavam, mas também nos divertíamos nas inúmeras brincadeiras que tinham o Mercado e o Pavilhão como cenários.
Ainda sinto o sabor da manteiga do sertão vendida na bodega do “Seu” Cândido se desmanchando no bolachão da Padaria Primor. Ainda ouço o toc-toc dos tamancos de madeira comprados no barracão do Mané Rosendo e aspiro o cheiro das brilhantinas coloridas expostas no Pavilhão.
Se soubesse desenhar, seria capaz de colocar no papel aquela expressão ranzinza de “Seu” Aprício ou a magreza quixotesca de “Seu” Mangabeira. O bom humor de dona Mirthes, a elegância de “Seu” Juvêncio Lisboa. “Seu” Barreto, sempre antenado com a política, ficava horas conversando com Luis Fausto.
São tantos nomes e rostos que ficaram na lembrança. Alguns que já se foram e outros que aqui continuam em sua lida diária para sobreviver e que ainda hoje resistem no comércio de Penedo.
Comecei a trabalhar “de carteira assinada”, aos treze anos (naquela época era permitido), na Casa Almeida, com dona Cândida. Foi ali, no Mercado Público, onde iniciei oficialmente minha vida profissional como balconista. Entre linhas, grinaldas e entremeios, aprendi muitas coisas que carrego pela vida afora.
Por isso a minha ligação com a feira, com as pessoas do Pavilhão da Farinha e do Mercado Público de Penedo. Eu vivi ali, eu cresci entre aquelas paredes e conheci todas aquelas e essas pessoas.
Gente, pequenos comerciantes, balconistas como eu fui, que hoje vivem dramas pessoais, familiares e financeiros causados não pelas leis existentes, reconheço, mas pela administração e execução dessas leis.
Hoje, quando constato que a política e a lei que deveriam promover o que entendemos por justiça e bem estar, muitas vezes podem se transformar em agentes causadores de grandes injustiças e atrocidades, minhas lembranças e meu coração falam mais alto do que minha missão de noticiar os fatos.
O uso de bens públicos tem regras expressas em leis que são administradas e executadas por políticos, avaliadas e aplicadas por operadores do Direito. Se essas regras fossem observadas com responsabilidade, coerência, senso de justiça, imparcialidade, retidão e lisura, certamente não provocariam tanta angústia e desalento.
Mas infelizmente não é assim. Principalmente porque é ano eleitoral. Logo teremos os resultados mais convenientes e o barulho dos fogos de artifício das inaugurações vão sufocar os soluços dos injustamente derrotados.