Foi arquivada a Petição (PET 4854) em que o médico Jacob Kligerman pretendia que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se explicasse sobre declarações dadas durante a campanha eleitoral deste ano, quando classificou como uma farsa a agressão sofrida pelo então candidato do PSDB à Presidência, José Serra, durante passeata na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Durante caminhada que realizava em Campo Grande, em outubro, Serra foi atingido por uma bobina de adesivo, após ser alvo de uma bolinha de papel.
O arquivamento da ação foi determinado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello. Para ele, não há qualquer ambiguidade ou dubiedade nas declarações do presidente da República, fato que justificaria o pedido de explicação.
A solicitação do médico, que atendeu Serra após o ataque, foi feita por meio de uma interpelação judicial, utilizada para esclarecer uma situação considerada ambígua, como o conteúdo de uma declaração, por exemplo. Kligerman alegou que as declarações do presidente Lula acabaram por atribuir a ele a participação em suposta farsa, o que poderia configurar o delito de difamação.
A interpelação judicial é uma medida preparatória (e facultativa) para o oferecimento de uma queixa e se justifica quando, nos termos empregados ou no sentido das frases, não fica evidente a intenção de caluniar, difamar ou injuriar alguém. O ministro Celso de Mello esclareceu que não cabe pedido de informação “onde não houver dúvida em torno do conteúdo moralmente ofensivo das afirmações questionadas” ou “onde inexistir qualquer incerteza a propósito dos destinatários de tais declarações”.
Para o ministro, isso é “precisamente” o que ocorre no caso. Celso de Mello explica que a “leitura das declarações atribuídas (ao presidente da República) não permite qualquer dúvida em torno do destinatário das manifestações alegadamente ofensivas”.
Nas declarações, veiculadas em matéria jornalística, o presidente Lula afirma que Serra foi orientado por sua equipe a criar um “factóide”. O presidente diz que, no episódio, Serra “bota a mão na cabeça e vai ser atendido por um médico que foi secretário de Saúde do prefeito Cesar Maia, e foi diretor do Inca quando Serra foi ministro da Saúde”.
Lula, segundo a notícia divulgada à época, chegou a comparar a atitude de Serra à do goleiro chileno Rojas, que nas eliminatórias da Copa do Mundo, em 1989, no Maracanã, fingiu ter sido atingido por um foguete jogado por torcedores. “Venderam o dia inteiro que esse homem tinha sido agredido, e o que vocês assistiram foi uma mentira mais grave que a do goleiro Rojas”.
“Ao constatar-se que, no discurso ora questionado, ter-se-ia afirmado que mencionado evento constituiu uma `mentira´ − qualificada como de natureza `grave` − eliminou-se, consequentemente, qualquer perplexidade, cuja ocorrência poderia gerar incerteza quanto ao significado de sua mensagem, a tornar evidente a inocorrência, na espécie, de ambiguidade ou dubiedade”, afirma Celso de Mello.
O ministro também ressalta que, mesmo reconhecendo que o discurso do presidente não contém frases dúbias ou expressões equívocas, ele “não está a formular qualquer juízo sobre o fundo da controvérsia penal, por prematuro”.