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A Plenitude dos Tempos

 

Desde a descoberta da escrita, quando o homem passou a registrar a sua história, legando o conhecimento às sucessivas gerações, não existe para o mundo cristão um acontecimento tão singular e grandioso como o advento do primeiro Natal; e uma das coisas mais sublimes que pode ser considerada neste extraordinário evento é o modo como o Pai Eterno enviou o seu Filho a este mundo. “A plenitude dos tempos” é a expressão usada pelo Apóstolo São Paulo, em referência ao final de um longo período de espera e preparação, no qual Deus, na sua soberania utilizou a contribuição de três importantes povos antigos: os romanos, os gregos e os judeus. Os primeiros, que haviam consolidado o seu império, após muitas guerras e tinham estabelecido um tempo de paz, a pax romana, abriram as rotas marítimas para o comércio e construíram um sistema de estradas ligando todos os seus domínios, o que daria oportunidade para a propagação da mensagem cristã.

Os gregos com o seu idioma, que havia se tornado uma língua universal, semelhante ao inglês em nossos dias, viabilizaria a disseminação da mensagem do Evangelho. Finalmente os judeus, com a sua fé monoteísta, aguardando o cumprimento da promessa Divina da vinda do Messias, contida nas Escrituras Sagradas, que indicavam até o local de nascimento, conforme a citação do profeta Miquéias, registrada em seu livro (Miquéias 5.2), onde o mesmo afirma: “E tu, Belém, posto que pequena entre milhares de Judá, de ti me sairá o que será Senhor em Israel. Todavia, ao chegar o dia tão esperado, o advento de Jesus passa despercebido. É apenas revelado a alguns simples pastores que guardavam os seus rebanhos nas campinas da cidade de Belém. Os poderosos, entre estes, os líderes religiosos, não tomaram conhecimento. Segundo o relato dos Evangelhos, nem lugar havia nas pousadas, todas lotadas, em virtude do recenseamento decretado pelo Imperador Romano César Augusto, obrigando o casal José e Maria a se instalarem em uma humilde estrebaria. O paradoxo é que, para as elites judaicas, o Rei ansiosamente aguardado deveria nascer em berço de ouro, entretanto, o menino Jesus é colocado numa manjedoura.

Ao tornar-se adulto, mais uma vez contrariam-se as expectativas, o Rei tão esperado deveria entrar triunfante em Jerusalém com vestes finas e montado num garboso cavalo branco, no entanto, Jesus entra vestido com uma simples túnica e montado num pequeno jumento. No exercício de seu ministério, certa vez exclamou: As raposas tem suas tocas, as aves dos céus os seus ninhos, mas o Filho do Homem não tem um lugar para reclinar a cabeça.

Então, surge uma indagação para todos nós: por que Deus agiu desse modo? As prováveis respostas que me satisfazem, são dadas pelo maior interprete do Cristianismo, o Apóstolo São Paulo. Este afirma que Deus usa as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes, as coisas loucas para confundir as sábias, as coisas vis e desprezíveis e as que não são para aniquilar as que são, para que ninguém possa se gloriar diante Dele. (I Coríntios 1.27-29). Também, encontramos na singular revelação de São João, em seu Evangelho: E o verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade. (João 1.14) que o Deus Eterno se humanizou, para que houvesse uma comunicação direta entre o Criador e a sua criatura, que o “Filho de Deus” se fez “Filho do Homem”, para que os “Filhos dos Homens” se tornem realmente “Filhos de Deus”.

Ao chegarmos à comemoração de mais um Natal, vale a reflexão que neste mundo consumista onde o “ter” continua sendo mais valorizado do que o “ser” é oportuno, lembrar os verdadeiros valores do Natal, que devem estar acima das tradições das luzes, das ornamentações, das ceias, das trocas de presentes, tão convenientemente estimuladas pela mídia, e das renovações dos votos de paz, amor e esperança. Tudo é muito lindo, causa admiração e até emoção, todavia, não terá nenhuma valia, caso não haja nos corações o devido lugar do Cristo como Senhor e Salvador. Que possamos reconhecer o imensurável amor de Deus doando o seu filho Unigênito como a maior dádiva para a humanidade, e retribuí-lo, não apenas nas belas liturgias, mas, sobretudo, no nosso agir em favor dos excluídos de nossa indiferente sociedade. Este é realmente o “Natal de Cristo com Cristo”.