As 47 mulheres que ingressaram na primeira turma de praças femininas da Polícia Militar de Alagoas comemoraram na manhã de onte, dia 1º, no Auditório Aquatune, do Palácio República dos Palmares, 20 anos de atuação à frente da corporação. A solenidade aconteceu em clima de emoção e contou com retrospectiva fotográfica do começo da carreira, depoimentos da trajetória e conquista das mulheres ao longo destas duas décadas, bem como homenagens aos primeiros monitores e instrutores da turma.
A major Valdenize Ferreira, a única oficial superior dessa turma, recordou fatos que marcaram o início da profissão destas mulheres, a exemplo de enfrentar dificuldades e desafios em um universo predominantemente masculino. Durante a solenidade, foi contada a saga da mulher na corporação, cujo caminho foi marcado por lutas, lágrimas e vitórias. Segundo a major Valdenize, para ingressar na corporação àquela época, a mulher militar enfrentou preconceitos e exigências que chocavam com a sensibilidade versus vaidade inerente às mulheres.
“Só entrava na Polícia Militar quem tivesse no mínimo 1,70 de altura, fosse solteira, não tivesse filhos e só poderia casar depois que completasse dois anos de ingresso na corporação”, lembrou a major, emocionando-se ao recordar o choro das mulheres, sobretudo as de cabelos longos, que tiveram de cortá-los bem curtos, como forma de se assemelhar à aparência masculina.
“Mulheres de cabelos longos tiveram de cortá-los e muitas choraram”, reforçou, deixando patente que o sacrifício das primeiras praças, neste aspecto, não se repete nos dias de hoje. As policiais conquistaram as madeixas longas e podem soltá-las fora do horário de expediente. De acordo com ela, a exigência era uma forma de puni-las, uma vez que, na visão dos homens, elas estavam invadindo o espaço deles.
“Eles eram tímidos e desconfiados e não sabiam a dosagem de cobrança de trabalho. Exigiam que fôssemos supermulheres, mas em compensação fomos muito bem preparadas para a vida policial militar. Eles cobravam demais e a gente se preparava demais”, ponderou a major, salientando que, atualmente, em todos os postos ocupados por homens há mulheres desempenhando as mesmas funções, a exemplo do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), Radiopatrulha, funções burocráticas, entre outras.
Ainda segundo a major Valdenize, para ingressar na carreira militar, a mulher precisa ter coragem, motivação e disciplina, uma vez que vai trabalhar em defesa da sociedade. Ela lembrou um episódio em que ficou ferida na cabeça durante uma ocorrência, quando um homem tentava matar a esposa. “Coloquei a arma para trás e lutei com ele, com os outros policiais. Ele tinha um objeto cortante e atingiu minha cabeça. Levei vários pontos”, conta, orgulhosa por não ter usado a arma de fogo que portava, para se defender.
Na opinião dela, o conceito da Polícia Militar em Alagoas mudou de forma significativa com a presença feminina, trazendo razão e sensibilidade ao trabalho da corporação. “A mulher tem uma visão mais ampla de sua aplicabilidade de polícia junto à sociedade porque tem mais sensibilidade em momentos críticos. A mulher se sente parte da sociedade e, por essa razão, se sente mais segura nas missões, planejando melhor e buscando a perfeição”, reforçou a major Valdenize, coordenadora do Programa de Educação e Resistência às Drogas e à Violência (Proerd).
Não menos orgulhosa de fazer parte da PM alagoana, define-se a subtenente Luciane Souza, do Batalhão da Polícia Escolar, também integrante da primeira turma de praças femininas. Ela disse que ingressou na carreira por falta de opção de emprego aliada à influência de alguns policiais na família. “Achava as solenidades militares bonitas, mas não tinha a menor noção do dia-a-dia da profissão. Encontramos um ambiente masculinizado e tivemos de nos adaptar aos policiais e eles a nós, mulheres, recém-chegadas à corporação”, lembrou a subtenente.
Segundo ela, os ajustes necessários às duas partes trouxe como saldo a mudança de comportamento dos componentes da PM. “Eles (policiais masculinos) foram se moldando à gente, apesar da desconfiança no que se refere ao nosso potencial. Demonstramos que segurança não se faz só com truculência e uso de força, mas há situações em que há espaço para diálogo e resolvê-las sem violência”, destacou.
De acordo com ela, as mulheres à época atuavam em funções específicas, trabalhando com crianças ou como relações públicas, mas quando se deu a unificação dos quadros, elas conquistaram os mesmo cargos que os homens. Outro avanço que a adesão das mulheres trouxe à PM diz respeito à revista de mulheres, uma vez que somente os homens eram revistados. “A partir de então, as mulheres passaram a ser revistadas por policiais mulheres e os homens, por policiais masculinos e femininos”, contou a subtenente Luciana.
Entre os momentos difíceis que marcaram suas vidas, as militares recordaram da Operação Cor-de-Rosa, quando a artista Xuxa Meneghel visitou Alagoas, levando-as a permanecer durante três dias de pé e salto alto, fazendo a segurança da população e da estrela.
Durante a solenidade comemorativa dos 20 anos da mulher na Polícia Militar de Alagoas, foram homenageadas personalidades que fazem parte da história dessas mulheres, a exemplo do coronel João Evaristo. Ele foi destacado pelo caráter exigente, organizado e perfeccionista; o coronel Dimas Barros (comandante do pelotão da turma), aplaudido de pé pela plateia composta principalmente por mulheres; a coronel Cláudia (primeira subcomandante da Companhia Feminina da PM) e o 1º sargento Gilberto, monitor do pelotão da turma.