José Vécio dos Mártyres – 100 anos
02 de julho de 1913. Em uma casa situada à Rua Joaquim Nabuco, nossa tradicional e conhecida Rua da Santa Cruz, nascia meu pai, José Vécio dos Mártyres.
02 de julho de 2013, cem anos depois, percorri, na manhã molhada pela neblina que cobre a cidade, a ruazinha palco de tantas lembranças da minha infância e da minha juventude.
Parei em frente à casa que hoje não guarda mais as características da época. Foi reformada. Assim como foram reformados tantos conceitos e valores que adquiri ao longo da vida.
Meu pai, José Vécio, Vécio, como ele fazia questão de ser chamado e “Dedéu” pelos familiares, foi um homem, no mínimo, controverso. Sua inteligência e sagacidade, seu talento artístico e sua vocação e sensibilidade para com a beleza, contrastavam com a aspereza da intolerância.
Meu pai era um homem capaz de se emocionar com o desabrochar uma rosa e de vibrar com uma gota de sangue. De cultivar uma semente até vê-la brotar e transformar-se em árvore, a abater uma ave em pleno voo pelo prazer da caça. Meu pai foi o soldado que contestou a ordem para matar um desertor em plena batalha na Revolução Constitucionalista de 32, na Serra da Mantiqueira, e foi o homem que me ensinou a abominar a covardia.
Meu pai foi o homem que construiu tantas obras importantes como a Casa de Detenção e a Ala dos Imigrantes do Museu do Ipiranga, em São Paulo; casas, praças, escolas, a urbanização da Rocheira e o Raimundinho, logradouros como a Gruta de Fátima e o Cristo do Oiteiro e não soube alicerçar de forma segura e resistente as famílias que construiu ao longo da vida. Amou muitas mulheres e tenho certeza, também foi muito amado, mas amou ainda mais a liberdade. E a liberdade....bem, a gente nem sempre sabe o que fazer com ela!
100 anos depois do seu nascimento, ainda não sei como traduzi-lo ou traduzir os sentimentos que ele me inspirou: admiração, orgulho e vontade de abraça-lo sempre se misturaram à raiva e um desejo incontido de contestá-lo, sempre!
Meu pai me ajudou a nascer e morreu em meus braços trinta anos depois. Vivo, hoje ele teria exatos cem anos. Morreu frágil, querendo me dizer alguma coisa. Algo que talvez eu não tenha conseguido ouvir nem entender naquele momento, mas que se agora pudesse traduzir talvez fosse: honre quem você é, de onde vem e para onde vai.
Em nome dos meus irmãos, legado e herança que ele me deixou, José Décio (in memoriam), Walter, Oswaldo, Neide (in memoriam), Elizabeth, Péricles, Peridriano, Lúcia (in memoriam), Iara, Thêmis e Maria José Vécio, transcrevo esse texto escrito pelo nosso querido amigo Benedito Fonseca, da Academia Penedense de Letras, Artes e Ciências.
"José Vécio dos Mártyres (Zé Vécio)
Só sabe o brilho da Praça de Esportes do Raimundinho, quem adentra por uma de suas vertentes para ver o brilhantismo ensolarado daquele logradouro.
Escolas e escolas foram projetadas e construídas.
Frei Damião, Deraldo Campos, Anfrisio Ribeiro e tantos outros aplaudiriam, se vivos estivessem, seus nomes apostos naquelas unidades do saber. Praças e praças como: Henrique Equelman, escolas e a fábrica de gelo bem como a construção do parque que não mais existe (Praças dos Bichos) Adail Freire Pereira. E a praça, hoje, transformada em Frei Camilo de Lellis, que ele afizera com as belas figuras do Império Romano.
Além de faixadas, construiu as mais belas residências como a casa de Carlos Hora, a casa de Leonardo Lima Mota e a de Geraldo Cavalcante.
Sua obra prima está na urbanização do Forte da Rocheira . Aproveitando a encosta transformou a Rocheira no que é. Tudo isso graças aos auspícios administrativos de Raimundo Marinho.
No seu tempo, pensou Penedo com a alma arquitetônica militar deste Penedense que nascera na Rua Joaquim Nabuco, á 02 de Julho de 1913 e morrera em 28 de Janeiro de 1988, nos braços de sua filha, esta impávida e colossal mulher Martha Mártyres. Filho de Cesário Procópio dos Mártyres e Josefa Maria dos Mártyres que veio a se chamar José Vécio dos Mártyres.
Ainda jovem, partira para o Sul na companhia de seu pai. Luneta de Ouro era o seu paradeiro.
Três anos depois (1931) regressa a Penedo. Nesse período rebenta a revolução constitucionalista de 32. O então militar, que era do 20 BC, é transferido e luta veemente e na Serra da Mantiqueira é ferido. Recuperado, torna-se arquiteto pelo Ministério da Guerra. No Rio de Janeiro constrói o prédio da II Região Militar. Em São Paulo a casa de Detenção (Carandiru) e a Ala dos Bandeirantes do Museu Paulista. ( anexado ao Museu do Ipiranga em 1963). Em 1938 deixa o Exército. Em 1948 retorna a Penedo para não mais voltar.
Penedo deve a este homem o seu amor pela terra. Quem adentra Penedo poucos sabem que, no “H”, está Fátima que ele construíra e esculpira belíssima imagem. Da rua São José avista-se uma Penedo diferente e do lagar do Bonfim ele o projetara com alma de quem olha a sua cidade com vistas ao medievo. Este é o retrato de um homem que amou suas cinco mulheres, cachaça da boa e a cidade que lhe viu nascer, José Vécio dos Mártyres."
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