Wilson Lucena

Wilson Lucena

Jornalista, pesquisador e membro da Academia Penedense de Letras

Postado em 01/11/2009 22:42

A Terra onde todo mundo é músico

A Terra onde todo mundo é músico
Filarmônica Guarany "Composição Remota" - Mestre Nozinho

À margem esquerda do Rio São Francisco, a pitoresca cidade de Pão de Açúcar teve como primeiros habitantes os índios “Urumaris”. Nas noites de verão, a lua cheia refletia-se nas águas calmas do grande curso fluvial. Os nativos, historicamente precursores da música, denominaram a localidade de “Jaciobá”, que em língua guarani significa “espelho da lua”. Tal sensibilidade poética não deixa de ser um prelúdio da vocação musical que passaria a ser uma peculiaridade do pão de açucarense.

E, foi nessa terra, “onde todo mundo é músico”, segundo a célebre citação do magistrado Dr. Antônio Arecippo, que despontaram figuras ilustres da historiografia musical nacional, como o genial violonista e compositor, Manoel Bezerra Lima, o “Nezinho Cego”, e o maestro Tenente Antônio Francisco dos Santos, mestre e “ensaiador geral” de bandas militares no então Estado da Guanabara, graduado em regência e autor de mais de 40 dobrados e marchas militares, que se encontram incluídos no repertório das mais famosas bandas do país, com ênfase para o vibrante e conhecidíssimo dobrado “Comandante Narciso”, de sucesso até na Espanha.

Segundo a monografia Pão de Açúcar - História e Efemérides, do autor Aldemar de Mendonça, os maestros Emídio Bezerra Lima e Abílio de Carvalho Mendonça foram pioneiros na disseminação da “Arte de Carlos Gomes” na localidade. Como ocorreu nas demais cidades do Estado, a fase áurea das bandas de música, que ficou conhecida como "A época das filarmônicas", nunca foi devidamente documentada, inexistindo maiores resquícios históricos sobre a trajetória da banda da atual Sociedade Musical Guarany, bem como de outras corporações citadinas existentes à época ou de suas precursoras. Pelo que consta, a corporação, que tem como referencial de origem a data de 15.03.1918, não detinha constituição formal, nem tampouco possuía vínculos com qualquer instituição local. Em realidade, enquanto em vida, foi inteiramente mantida pelo Sr. Manoel Vitorino Filho, o "Mestre Nozinho", maior ícone da história da banda de música em Pão de Açúcar, que passaria para a notoriedade como o incansável fazedor de músicos.

Sergipano de Neópolis, discípulo do mestre Emídio, professor, idealista, competente e desinteressado de qualquer remuneração financeira, desde o ano de 1917 até a sua morte em 1960, apenas com os parcos recursos da profissão de alfaiate, conseguiu manter a banda de música e uma orquestra de baile, com destaque para a impecável "Batuta" de 1922, sendo responsável, ao longo de quarenta anos, pela formação de três gerações de músicos. Seus dois irmãos, Américo de Castro Barbosa e José de Castro Barbosa (Duda), que residiram no Rio de Janeiro, também foram músicos extraordinários com passagens em orquestras famosas, inclusive internacionais, como a do notável regente “Fon Fon”.

Dentre os seus discípulos de carreira expressiva, podem ser destacados os maestros e mestres Racine Bezerra Lima (19º BC Salvador), Manoel Capitulino de Castro, o "Passinha" (Batalhão Exército Maceió), Francisco Ferreira e Fernando Mendonça ( Base Galeão RJ), Jonas Pauferro (Polícia Militar Alagoas), José Batista de Aquino, o “Duduca”, ( Polícia Militar de Sergipe), Zivaldo Ribeiro, “Zico” ( Batalhão de Guardas do Exército RJ) e toda plêiade de músicos e regentes da família Ramos: Petrúcio, Anacleto, Valter ( Base área Salvador), César (Polícia Militar Bahia) e Acilon (Polícia Militar Pernambuco).

Galeria de músicos: clarinetas: João Damasceno Souza (João Barateiro) - Ercílio - Etelvino Américo de Castro Barbosa – Francisco Simas – José Guimarães Pauferro – José Gonçalves Filho (“Zequinha de Mestre Salo”) – Valdomiro Mendonça – José Bento: Flauta: Jucelio Nascimento (genial flautista); requintas: Francisco Ferreira,“Mestre Chico” – Cícero Francisco de Brito, “Cafal” – Temístocles – José Mendonça; trompetes: Perdiliano de Souza, “De seu Né” – João Francisco da Silva - Racine Bezerra – Petrúcio Ramos – José Vieira – José Ramos – José Brandão de Souza – Bonerj Bezerra; trombones: Olegário - Antônio Simas João Rodrigues de Souza – Jonas Pauferro – Manoel Capitulino de Castro (Passinha) – Benedito dos Santos – José Batista de Aquino – José de Castro Barbosa; saxofones alto: Acilon Ramos – Valter Ramos – Anacleto Ramos – Norfolk Gomes dos Santos; saxofones tenor: José Mendonça – Zivaldo Ribeiro (Zico) – Williams Magno (Bille); bombardinos: Fernando Mendonça – Francisco Antônio dos Santos (Mestre Chiquinho) – Milton Torquato; trompas: Yoyô Vieira - José Alves dos Santos (Dedé Penteado) – José da Mena; contrabaixos: Lourival Simas (hélicon) -Afrânio Menezes (Bubu) – Luiz Marsiglia – Luiz Ignácio - Antônio de Melo Barbosa – Acineto Lima – José Ramos dos Santos (Zé de Caxapá); tambor: José Profeta Sobrinho (Carvão) – César Ramos; caixa: Erivaldo Ribeiro - Júlio Alves de Carvalho; pratos: José Costa – Jose Góes – Edidiê (Dezinho) - Manoel Rodrigues (Manoel de Iveco) e bombo: mestres Nozinho e Paulo.

Após a morte do mestre Nozinho, a corporação atravessaria um hiato de atividades, remanescendo apenas um grupo de músicos liderado pelo contrabaixista Afrânio Menezes Silva, o "Bubu". Mas, em meados de 1999, com a chegada do competente maestro, Petrúcio Ramos de Souza, oficial-regente reformado da banda da Base Aérea de Salvador, surgiu um novo surto musical na cidade de Pão de Açúcar e a formação de uma jovem e magnífica banda de música, inclusive dotada de instrumental importado.

Com a tutela da Loja Maçônica Jaciobá e o apoio parcial da Prefeitura Municipal, em pouco tempo, à luz de sua formação militar, o renomado mestre Petrúcio transformou uma garotada de tenra idade em musicistas disciplinados e de excelente padrão técnico. Nesse magnânimo trabalho de ordem cultural e social, também merece ser ressaltada a valiosa contribuição emanada de seu saudoso mano mais velho, o notável músico José Ramos.

Hoje, a Banda de Música Guarany é um orgulho da comunidade e uma grande revelação do Estado de Alagoas, sendo destaque, por onde se apresenta, pela sua disciplina, harmonia, e sonoridade. Novos talentos, como Sérgio Oliveira - Samuel Vieira - José Pauferro Neto - Jobe Alves - Ruan de Brito - Emerson Roniere e José Maurício dos Santos, perpetuam os grandes expoentes musicais do passado e a grande vocação musical da pitoresca cidade de Pão de Açúcar.

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  • Francisco Araújo Bela pesquisa, Wilson. A memória musical de Alagoas agradece.
  • Mateus Godoy Wilson, Ótima pesquisa Gostaria de saber se nesta sua pesquisa você possui fotos da galeria de músicos. Sou neto do Norfolk Gomes dos Santos. Caso tenha outras fotos, por favor, entre em contato
  • adriana souza voce não sabe o quanto estou feliz .só descobri hoje esse documentário;num momento de saudade do meu querido pai ACILON RAMOS,onde digitei seu nome pra matar a saudade e na certeza de que nada iria encontrar.derrepente fui surpreendida com esse maravilhoso documentário.me emocinei bastante...meus tios queridos,estou distante deles,em recife ,mas nunca os esqueço.amo pão de açúcar,aprendi a andar onde meu pai andava e herdei a música,não sou como meu pai e acho que nem vai existir,mais estudo clarinete e canto.agradeço tudo a ele o ser humano que sou, a meu querido pai ACILON RAMOS.muito obrigada.
  • Tatiana Obrigada pela pesquisa, Wilson ! Sou neta do Norfolk Gomes dos Santos e gostaria de saber se você tem mais algum material sobre a orquestra, fotos ...
  • Jose Guimaraes Pauferro Neto Estava fazendo uma pesquisa no google com meu nome quando fui surpreendido com uma matéria em que falava da banda musical Guarany e li nomes que integraram nela e em especial destaques os que fizeram carreira militar e outros na vida civil, dentre os citados vi o nome do meu tio e o meu também.
  • Augusto Moura Senti falta do saxofonista Manoel de Neco!