Venceu a Irracionalidade: O Privilégio do Absurdo
O filósofo Hobbes já havia anunciado tempos passados que somente o homem tem o “privilégio do absurdo”. Isto para dizer que somente a criatura racional pode ser irracional. Irracionalidade é um processo ou estado mental — um processo ou estado racional — que falhou. Mas, entenda que o irracional não é apenas o não-racional ou aquilo que está fora do âmbito racional; a irracionalidade é uma falha dentro da casa da razão. Como isso é possível? E como isto pode ser sugerido dentro da seleção para contrato temporário na prefeitura de Penedo: primou a irracionalidade para privilegiar a alguém? Será que os critérios são acráticos?
O problema de explicar tal comportamento preocupa filósofos e moralistas pelo menos desde Platão. De acordo com Platão, Sócrates argumentou que, uma vez que ninguém age voluntariamente contra aquilo que sabe ser o melhor, apenas a ignorância pode explicar ações frívolas e nocivas. A isto chamaremos de paradoxo, mas a visão de Sócrates é paradoxal somente porque ele nega aquilo que todos nós acreditamos, a saber, que há atos acráticos(que são realizados por fraqueza da vontade). Se Sócrates está certo — se tais ações são descartadas pela lógica dos conceitos — então não há nada problemático sobre os fatos a serem explicados. Contudo, Sócrates (ou Platão) deu destaque ao nosso problema: há um conflito entre a maneira usual de explicar a ação intencional e a idéia de que uma ação pode ser irracional. Uma vez que a visão segundo a qual nenhum ato intencional pode ser internamente irracional encontra-se em um extremo no contínuo de visões possíveis. Neste sentido, se algum candidato está sendo privilegiado por já terem experiência dentro do setor, nada há de intencionalidade ou de irracionalidade, ou será que existe?
Pois bem, o que expõe o edital 01/2010 sobre os critérios para a contratação de pessoal pela SEMTHAS é, no mínimo, um ato aparentemente não intencional. Em tempos de ciência e seu status de objetividade, clarividência, etc. fazem-nos pensar que a lisura de um processo seria garantida pela claridade e objetividade dos critérios, sobretudo porque estes favorecem a todos os candidatos dirimir as possíveis dúvidas surgidas, além de ratificar a credibilidade de quem dirige um processo desta natureza. De fato, como compreender que se possa escolher de forma ciente e deliberada a opção menos proveitosa? Repito: nenhuma intenção há nisto. Trata-se apenas de um privilégio do absurdo! Simples assim...
A SUBJETIVIDADE, contrário à ciência, imperou na seleção. E veja-se que não foi intencional, nem irracional.
1. O Edital expõe como critérios:
Experiência na área de atuação – 0 - 50 pontos
Titulação (graduação, pós-graduação, mestrado, doutorado, certificados) – 0-50 pontos
Insta anotar que:
a) Convém esclarecimentos e objetividade quanto ao tempo de experiência e quanto aos pontos para cada ano ou fração de ano. QUAL EXPERIÉNCIA? “Disseram” que é experiência no setor...
b) Também deve-se objetividade quanto à pontuação para cada título e/ou certificados.
Ex.: Doutor – (x pontos); Mestre (x pontos); Especialista(x pontos); graduação (x pontos)
*** Esclareça-se ainda sobre os CERTIFICADOS DE CURTA DURAÇÃO.
Entre X horas e Y = x,x pontos (por cada certificado)
Entre Z e F = x,x pontos (por cada certificado)
c) CRITÉRIO NÃO OBJETIVO: “Os títulos que excederem o valor máximo previsto não serão considerados para a pontuação do candidato” (Edital item 4.10). QUAL O EXCEDENTE? O QUE E ONDE ESTÃO PREVISTOS?
2. AVALIAÇÃO DE REDAÇÃO
Concordo plenamente! Porém, NÃO ESTABELECE OS CRITÉRIOS. Nota mínima!
3. ENTREVISTA – AVALIAÇÃO POR PROFISSIONAL
Vê-se inadmissível em concurso público, utilizar-se do critério “ENTREVISTA”, sem qualquer regulamentação, sem caráter científico, por demais subjetivo, como meio de selecionar e avaliar o candidato. Não existe previsão legal, nem previsão no edital que estabeleça os critérios de avaliação dos candidatos pela “entrevista” - O art.. 37 Inciso II da C.F. condiciona investidura em cargo público a aprovação prévia em concurso público de provas e títulos, não a entrevista reservada e sem oportunidade de contradição, garantidas no Inciso LV do Art. 5.º da C.F. (TJMG, apel. 155.431.0, apud Jurisp. Mineira 149/286).
A CONSTITUIÇÃO FEDERAL em seu art. 37 inciso II é claríssimo ao exigir que os cargos públicos devem ser preenchidos através de aprovação prévia em concursos públicos de provas, não prevendo a possibilidade de adotar o critério de “entrevista” como meio e modo de se aquilatar a capacidade do candidato, in verbis:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.
A conclusão disso é simples: ora, de certo modo pode ser racional adotar voluntariamente uma crença, desde que seja essa a preferência do agente. O auto-engano não é seguramente racional do ponto de vista epistémico (ou cognitivo), mas pode revelar-se racional do ponto de vista prático. Resta todavia saber como é que isso é possível fazer para acreditar naquilo que se sabe (ou se suspeita) ser falso? Uma coisa é desejar acreditar numa falsidade, outra coisa é conseguir acreditar efetivamente numa falsidade. Essa questão tem alimentado um vasto debate entre os defensores do “voluntarismo doxástico”, para os quais é possível induzir voluntariamente a crença que se pretende, e os defensores do “evidencialismo doxástico”, para os quais as crenças são essencialmente determinadas por fatores causais ou epistêmicos independentes da vontade do sujeito.
Ora, por definição, a concepção intencionalista do auto-engano pressupõe uma certa forma de voluntarismo acerca da crença, uma vez que só faz sentido falar da intenção de se enganar a si mesmo sob condição que seja efetivamente possível controlar de forma voluntária aquilo em que se acredita. Assim, as explicações vinda do lado da SEMTHAS são de que não houve nenhuma intenção de privilégios. A nós cabe-nos conseguir acreditar efetivamente! Tudo é uma questão de mera coincidência irracional!
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