Jean Lenzi

Jean Lenzi

Ator, dramaturgo, encenador teatral e ativista cultural

Postado em 08/11/2009 18:35

Tropícaos

Tal como orgulho para o Brasil é a cidade do Penedo, sua poesia, suas ruas de paisagens bucólicas que chegam a confundir o ouro preto e o barro vermelho, (há quem insista em afirmar que somos a Ouro Preto do nordeste; eu fico no contrário, já que Penedo está na contramão do progresso; poderia sim acreditar ser Ouro Preto a Penedo do sudeste; mais tudo isto é só teoria, a realidade distinta das duas comunidades é mais importante), as histórias mal-contadas e mal-escritas, que mesmo assim permanecem histórias, o sossego do povo, a ociosidade dos jovens, a pouca inteligência dos políticos, as intrigas dos grupos sociais sejam quais forem, também formam juntamente às bocas malditas a Cidade do Penedo. E tudo isto por que Penedo não é da política tucana, ou da libertária, não é da educação falida ou da expoente, não é de uma classe artística desunida, não da Igreja católica ou da protestante, menos ainda do Candomblé, não é da juventude oligofrênica, dos bandidos fugitivos ou dos que circulam normalmente. A cidade do Penedo só tem razão para existir porque é formada por tudo isto junto.

Contemplados por uma educação falha, herança de um Estado analfabeto, o povo do Penedo desconhece (acredito) até as razões para que escrevamos “do Penedo” ao invés de “de Penedo”, o que pode parecer bobagem, ou um detalhe para cegos, mais é somente o principio de nosso caos. Pois bem, vamos à explicação que obtive também há pouco: “A cidade do Penedo desenvolveu-se sobre um acidente geográfico, grandes penedos, rochas enormes que formaram paredões às margens do rio São Francisco, a exemplo da cidade do Recife em Pernambuco, cujo nome também advém dos arrecifes no qual explica o escritor Gilberto Freyre”. Também poderá lembrar uma cultura de almanaque, mesmo até uma cultura vasta inútil, mas longe de tudo isto, deveríamos atentar a estes detalhes que dão a Penedo a diferença, a importância e a certeza de não sermos nós, cidadãos ignorantes de nossa própria história.

Em razão da II JORNADA CULTURAL DO PENEDO promovida há algumas semanas pela ONG penedense Sociedade Cultural Barqueiros do Velho Chico, constituída por penedenses atuantes nas mais variadas áreas, o evento bianual tem como principal objetivo o somar de forças entre instituições, artistas e educadores a favor da cultura, do entretenimento e da educação neste município. As grandes intervenções promovidas pela II Jornada mostraram o quanto Penedo é carente de eventos dignos e verdadeiramente culturais, na oportunidade da Jornada Cultural, o espetáculo musical Uma cidade a Cantar e o baile O Grande Encontro foram incorporados à mostra para abrilhantar toda a semana de 13 a 17 de outubro, na qual se realizou o evento, que foi acompanhado por uma minoria de jovens, por uma maioria de intelectuais, por outra maioria de artistas e educadores. Isto é importante ser comentado para talvez tocar a razão da juventude que é a classe mais preocupante de nossa sociedade.

Foi apresentado na noite de abertura o show de um grupo para-folclórico em praça pública, na oportunidade em que foram entregues à personalidades da cultura do Penedo a Comenda do Mérito Cultural Barqueiros do Velho Chico, justificando o respeito e agradecimento dos que fazem a Barqueiros do Velho Chico a penedenses como Francisco Alberto Sales da Fundação Casa do Penedo, à Lísia Ramalho Marinho da Fundação Raimundo Marinho, ao imortal Ernani Otacílio Mero, entre tantos outros lembrados pela Comenda.

São iniciativas iguais a esta que partem de cabeças ilustres como a da educadora Lúcia Regueira que deveriam ser copiadas pelos agentes de entretenimento de plantão em Penedo, recordo-me do vandevour instalado em razão dos bailes posteriores à Jornada, que ao contrário desta, nos dois eventos foram cobradas taxas e obtiveram números estrondosos de participação jovem. Jovens que não quiseram espiar o concerto de uma cantora lírica gratuito no Convento Nossa Senhora dos Anjos, trocando a elegância eucarística do convento pelo infecto lamaçal do trevo. Foram estes os jovens que se recusaram a assistir a palestra sobre preservação patrimonial promovido pela Universidade Federal de Alagoas, parceira do evento, também renegaram a cerâmica do Mestre Capilé e os Santos do Higino e tudo isto a favor de não gastarem suas energias a espera do grande momento; se jogar e cair na poeira dos bailes da baixadinha à espera também da perguntar crucial: “Quem gostou dá um gritão aêeeeee!”.

Tudo isto é muito próprio de um país tropicaos, mais ainda de uma cidade que tropeça a cada dia em seu espírito passional e altamente corrosivo. Comento isto por sentir a falta da platéia jovem quando dançavam os guerreiros do Transart, pela falta própria dos guerreiros do Penedo, ou quando ecoava potentes e melódicas vozes pelo cenário natural do centro histórico, isto na calada da madrugada e nem mesmo lá estava a juventude do Penedo para gritar à liberdade e às boas práticas. Salvaram-se as presenças de pré-adolescentes, adolescentes, crianças e velhos participantes da II Jornada Cultural, consagrada mais uma vez por sua persistência e inovação.

Nossa razão é falha quando dizemos que Penedo é uma cidade parada, morna; é bobagem ignorar coisas feitas com tanto empenho a troco de um simples “eu não vou” ou “eu não gosto”, o não gostar é o que menos interessa, importante mesmo é a presença, é a soma, é o respeito por um trabalho que foi pensado do começo ao fim para a juventude, para o resgate, para a preservação, para o desenvolvimento e a promoção da educação.

Vale aqui um puxão de orelha a toda a juventude do Penedo: antes de dizer que não gosta, primeiro conheça, vá lá e veja você mesmo o que de incomum está acontecendo de baixo de suas ventas, reúna suas patotas e discutam sobre o que realmente é importante para vocês e depois é só cair na poeira, porque bem sabemos nós que neste país tropicaos, “o sol que peca, só quando, em vez de criar, seca” também nasceu para todos.

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  • Nani Rodrigues Oi Jean! Muito Interessante você chamar á responsalidade a juventude para esse foco... Torço para que os jovens "acordem", o quanto antes, e percebam o quanto importante é, a cultura - Em especial, a nossa cultura nordestina!
  • Madileide Oi Jean, devemos isso a administrações públicas que ao invés de implementar a cultura local principalmente nas escolas e em eventos importantes da cidade, preferiu o apelo de massas, cultura de outro lugar que são os trios elétricos... Ainda há tempo para o resgate, apesar do desgaste!